PAULO VASCONCELOS -ECA-USP
AH! ESSA LINGUAGEM.
Eu tenho a medida que designo- e este é o esplendor de se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais a medida que não consigo designar. A realidade é a matéria prima, a linguagem é o modo como vou buscá-la- e como não acho. Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia, e que instantaneamente reconheço. A linguagem é o meu esforço humano.Por destino tenho que ir buscar e por destino volto com a s mãos
vazias. Mas- volto com o indizível. O indizível só me poderá ser dado através do fracasso da linguagem. Só quando falta a construção é que obtenho o que ela não conseguiu. (Lispector-PSGH,178-1989)
Clarice Lispector ao falar sobre a criação constrói reflexão sobre a linguagem. Para ela a linguagem é da condição humana. Somente nós, os humanos, podemos falar na linguagem e pela linguagem. Sem a linguagem estaríamos no caos, a ordem não se estabeleceria, nem tão pouco a inteligência, nem o pensamento.
Benveniste lembra que uma das funções da Linguagem é -reproduzir a realidade. Na verdade, como lembra Garcia- Roza - não é reproduzir no sentido de fazê-la em fac-símile-, mas -produzir .novamente. E ainda como lembra este último, não é apenas o mundo que é criado pela linguagem, mas o próprio pensamento. Afinal destaca Benveniste que não há pensamento sem linguagem, sem linguagem não há o que se pensar do -Mundo humano. Sem linguagem o “mundo humano desaparece. “
Sublinha ainda Garcia- Roza que:
“ É nesta medida que , ao reproduzir a realidade, a linguagem o faz segundo a organização que é a sua, de tal modo que a reprodução é na verdade uma recriação constante. A ordem da realidade e a ordem do discurso são indissociáveis.” (Garcia- (Roza: 1991))
Destaque-se ainda que é com os Gregos- na conceituação do -LOGOS - onde se implicam- discurso e razão ao mesmo tempo.
Mas, indo por parte, a linguagem é sobretudo a ligação - o ligare - entre o sujeito e o mundo. Esta mediação sujeito e o mundo é do contexto do SIGNO, por isso nós podemos dizer: EU DESIGNO.
Portanto pelo signo eu construo a linguagem, e digo, e tenho o meu pensamento. A linguagem, é o modo, a via pela qual eu me estabeleço como sujeito do enunciado, da palavra, do pensamento e da linguagem..
A linguagem, assim como , o signo são do contexto humano e social. O social, nas sua relações constróem a trama de sentidos, significados, onde a linguagem busca sua matéria prima. A linguagem e, por conseqüência ,a comunicação realizam a condição humana, a medida que designa, ordena , nomeia e qualifica.
Clarice destaca isto ao afirmar. A liguagem é meu esforço humano- esforço em produzir sentido- significado, ou mesmo , ligar seu sentido - pessoal- ao que se vislumbra pelo mundo- mundo- do social onde a linguagem vai - buscar. significado.
Se faz necessário que de antemão superemos como diz Santaella, “o preconceito verbalista”, que restringe o termo linguagem apenas à -linguagem .verbal.(Santaella:1993)
Sem absolutamente deixar de reconhecer sua “onipresença”, até mesmo pela sua condição de poder significar , a maneira como a linguagem constrói suas significações, e assim compõe sua função metalinguísitca ou metasemiótica, a linguagem no entanto não se reduz a linguagem verbal.
Aponta Santaella a diferença entre -língua e linguagem verbal:
“ Enquanto língua refere-se exclusivamente a linguagem verbal,. linguagem refere-se a qualquer tipo possível de produção de sentido, por mais ambíguo, vago e indefinido que seja. É assim que a poesia é muito mais linguagem do que a língua e é assim também que o cinema e a música, por exemplo , são linguagens sem serem línguas”(Santaella: in Comunicação & Política :1993)
Santalella complementa sua compreensão em torno de Linguagem ao afirmar que - tudo é linguagem. Deste modo tudo aquilo que é captado pelos nossos sentidos, portanto, percepcionados, e elaborados cognitivamente se põe na esfera dos paradigmas do que vem a ser “linguagem no sentido lato.’ Assim ‘ linguagem seria tudo aquilo que é capaz de tornar presente um ausente para alguém, produzindo nesse alguém um efeito interpretativo”.(Santaella;1993)
Se tomamos a frase de Clarice que diz:
“Por destino tenho que ir buscar e por destino volto com as mãos vazias. Mas - volto com o indízivel”.
A isto chamaríamos de efeito interpretativo, ou seja, esse vago continuum que se interpola entre nós e as coisas. Na medida em que nos leva a compreensão, nos leva também a nos por ao longe daquilo que vemos ou queremos entender, ou como adjetiva Santaella , “como um espetáculo adverso entre aquele que vê e aquilo que é visto (Santaella Comunicação & Política: 1993)
Neste sentido, a linguagem - tenta representar- ou ousa representar- Buscar pela palavra o real, buscar na escritura o dízível é deparar-se com o indízivel,.ë como se fora o real demasiado para subsistir ao amalgamento da escritura que é reducionista, não inteiramente palpável, mas, como diria Barthes, - esse é o desejo da palavra, ou “o real não é representável, e é porque os homens querem constantemente representá-lo por palavras que há uma história da literatura.... que não haja paralelismo entre o real e a linguagem, com isso os homens não se conformam.”(Barthes:19
Se os homens não se conformam, e é com este incorformismo ou ressentimento Nietzscheano, que se abrem as portas da criação, do exprimível, e com isso se elabora um mundo humano demasiadamente humano que é da esfera do imaginário, que se confronta com o real- hipótese-, e dai criam-se as verdades do possível humano. Isso para Barthes seria o poder de fomentar a criação de significados ou o campo da semiose- o signo em ação. Aqui nos deparamos com a força da Semiótica, no sentido de estudar as malhas e teias dos significados, para entender melhor as linguagens e todo o seu manancial ideológico que naquela se interpõe.
O SIGNO - SUA FENDA-
O signo é a grande tessitura das linguagens. Ele constrói uma realidade interpretando aquilo que é dito como realidade. O signo é a manifestação do saber humano através do qual construímos nossa humanização e garantimos o conhecimento.
Charles Sanders Peirce (1839\1914), filósofo americano dedicado ao estudo do pragmatismo. O termo -semiótica foi utilizado por ele, criando uma disciplina, ou uma teoria geral dos signos. A sua teoria ou projeto semiótico, é uma doutrina quase necessária ou formal dos signos. Para ele, todo o pensamento é um signo, sendo o homem um signo.
Para Peirce o signo ou representamem é um primeiro que está em genuína relação triádica com o segundo, chamado seu objeto, de forma a ser capaz de determinar que um terceiro chamado interpretante, assuma a mesma relação triádica(como objeto) que ele mesmo mantem em relação a ele mesmo. Peirce consegue no seu projeto superar a relação diádica Saussureana que prevê a existência no signo de um significante\significado.Ele cria a figura do interpretante, que nada mais é que um signo de outro signo.(Rodrigues:1991)
Assim um significado de um signo será sempre um outro signo. Umberto Eco dá exemplo disto, através da figura do dicionário, em que apalavra remete a outra e assim sucessivamente. O significado peirceano é um processo significante que se desenvolve por relações triádicas sendo o interpretante o resultado ou o signo\resultado in continuum que produz esse processo interpretante.
Distintamente de Saussure, Peirce formula uma teoria do signo a partir da totalidade do conhecimento, confundindo-se com uma verdadeira lógica. Já para Saussure sua teoria se formulava a partir da linguagem..
Ao observar a definição do signo em Peirce pode-se melhor perceber os detalhamentos e implicações do signo com relação a realidade e sua possível forma de captá-la:
“um signo ou representamem é algo que sob certo aspecto ou de algum modo representa alguma coisa para alguém. Isto é , cria na mente dessa pessoa um signo equivalente ou talvez um signo melhor desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro signo.”(Peirce:1984)
Ora a representação sígnica ocorre por captação do possível e de parte da realidade, assim vejamos, decoupage de seus elementos:
.um signo é uma coisa que representa uma outra coisa - seu objeto;
.o signo só pode ter sua eficácia se funcionar como tal se carregar o poder de representar, ou seja de substituir, uma outra coisa diferente dele;
. o signo representa sob um certo aspecto- ou por um certo modo de assim poder captar ou querer captar.o representado
.do captado é erguido um novo signo equivalente, ou talvez mais adaptado.
.o signo representa a coisa ou o objeto para um intérprete;
.o interpretante não se refere ao intérprete pessoas, mas a uma relação que se cria na mente .
.a relação da representação que o signo mantêm com seu objeto produz na mente interpretadora um outro signo que traduz o significado do primeiro.
Por essas características, e mais se observarmos a origem do termo signo percebemos a
faceta dele em não poder ser um verdadeiro espelho do que é captado. Ele é sempre uma tentativa de representação do real..
Também , a partir de sua origem etimológica -Signo- vem da palavra grega -sec mon- que quer dizer cortar, extrair parte. Daí, .ter-se uma busca de síntese - de um lado, o que se quer representar, e o possível da representação.
Volochinov- pertencente ao círculo de Bakhtin ao propor uma definição do signo o faz tomando por referência a imagem especular, e com isto informa com precisão a duplicidade paradoxal do signo como algo que é, a um só tempo, ele mesmo e um outro.
Santaella interpretando Volochinov assim se coloca:
“Todo signo é, em maior ou menor medida, uma espécie de imagem especular: o signo não é apenas um corpo físico que habita a realidade , mas também é capaz de refletir esta realidade de que ele é parte e que está fora dele.”(Santaella : 1992)
A autora destaca que a medida que o signo se põe como imagem - especular- esse espelhar necessariamente transfigura, deforma a realidade sem nenhuma escapatória. O signo segundo, interpretante do primeiro é um outro que não é o mesmo - o primeiro. Portanto o signo é sempre um que está no lugar do outro, e entre ele e o outro fixa-se uma fenda , uma brecha, uma deformação, ou incompletude.
Na verdade o signo, mesmo enquanto vontade de representação é a própria presença do incompleto ou da falta, face a realidade inatingível, mas ao mesmo tempo ele é a única escapatória para o possível da mediação entre realidade e a representação.
Para observar a vontade de representação da palavra ,e a possível consciência da realidade temos em caráter exemplar o fragmento do poema de Manoel de Barros: Uma didática da invenção in O Livro das Ignorãças
“O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa
era a imagem de um vidro mole que fazia uma volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse : Essa Volta que o rio faz trás de sua casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro
que fazia uma volta atrás de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.( Barros :1993)
OS ESTEREÓTIPOS.
Já observamos a forma tendenciosa da linguagem, seja pela condição da impossibilidade total da representação, seja pelo tendencioso ideológico imanente ao contexto sócio-político e econômico.
Uma das formas de falsa representação ou por decorrência ideológica , tem-se o estereótipo.
Introduzido nos estudos de Comunicação por Walter Lippman, aquele termo se constitui fato observável no campo das linguagens, especificamente na Linguagem verbal.
Não só a lingüística, a Comunicação, assim como a Psicologia Social tem se debruçado sobre o estereótipo no sentido de estudá-lo cercando seu campo de ação, sua conceituação e características.
Lippmam ao definir o estereótipo o faz afirmando que ele designa uma opnião preconcebida acerca de atributos exteriores. Caracteriza ainda aquele autor o estereótipo como sendo um mecanismo que ajuda na economia do pensamento que organiza nossa experiência dando lugar as generalizações(Lippman:1972).
Pa ra Lippmann a experiência observada e retida se afigura na maioria das vezes como algo selecionado do que foi retido.Para ele os fatos que absorvemos, se fazem por um mecanismo econômico, no sentido de rete-lo por uma posição em que me encontro, e somado a isto, pela perspectiva de nossos olhos.Este mecanismo dá lugar a uma economia do pensamento, mas a sua deformação respectiva.
Chama ele atenção para o fato de que na grande maioria das vezes, definimos algo para so depois vermos o definido..Acusa também ele a cultura como repositório do pre-estabelecido, e que ali recolhemos para nossa experência algo ja eivado de estereótipo.
Desse modo imaginamos o mundo , ou as coisas antes mesmo de experimentá-las e as guardamos, produzindo uma ingenuidade perceptiva e individualizada, portanto dentro da angularidade da deformação de nossas experiências subjetivas.E por cima ainda aplicamos tais percepções deformadas com demasiada generalizações.Assim colhemos os fatos nas generalidades, particularizamos sob o nosso angulo perceptivo, e voltamos a aplicá-los a novas generalidades.
Esse aspecto da consistência do estereótipo e sua circulação automatizada, no âmbito do social leva até a pensar que este fato seria de caráter biológico.O que na verdade não é, pois trata-se de uma fato da linguagem e da cultura, mas sua automação é tamanha , que chega-se a comparar com a eficiência do fato biológico.
Na verdade o que se percebe nas palavras de Lippmann é o mecanismo da interpretação, ou dos estereítpos produzidos pela linguagem e sua agregação aos conteúdos da Cultura, e que os indivíduos os acatam com uma credulidade automatizada.
Agnes Heller ao considerar sua ponderações sobre o preconceito, destaca a figura do estereótipo, sublinhando como Lippman o caráter de imposição social , procedido pela cultura, mas destaca o estereótipo num enfoque do Cotidiano.
O caráter da fugacidade ou rapidez do cotidiano também patroicina essa deformidade do pensamento , na figura dos estereótipos.Para Heller a “ultrageneralização “dentro do cotidiano é inevitável.Nosso discurso se embasa em cálculos “probalísticos”, pois pela rapidez do decurso do tempo nos discursos não há tempo para acertivas científicas.
Assim explicita a autora que aquilo que para a ciência é uma opnião, no cotidiano é um saber, mesmo que provisório.
No cotidiano , sublinha a autora, o que queremos, dentro da atividade do trabalho, é “um mínimo de esforço”, o que leva a uma maior integração e rapidez do todo cotidiano, mas não resiste enquanto provisoriedade de juizo e de valores.Pode-se caminhar então a partir do estereótipo para a figuar do preconceito. Por isso aponta a autora que grande parte dos preconceitos se montam e m estruturas estereótipadas.
Eclea Bosi ao refletir sobre o estereótipo principia suas ponderações apontando o caráter ilusório de participação no mundo em que se vive, pois na verdade conhecemos parte e queremos intuir o todo.
Destaca também o caráter da ação e percepção que guia nossa atividade interacional com o mundo, sublinhando o trabalho perceptivo no recolhimentos da interfaces do real , e que nos credencia ao conhecimento e reconhecimento da realidade.
Esse recorte perceptivo do sujeito sobre o objeto é guiado por procedimentos econômicos, do tipo facilitador, onde se apreende “aspectos”do real, ja recortados e confecionados pela cultura.Tal afirmativa da autora confirma as posições anteriores de Lippmann e Heller.
Mas é esse recorte do ja consagrado culturalmente que coincide com o que chamamos de processo de esteriotipia, que da uma aparência ao fato social, ao do fato biológico, face a força como a esteriotipia é apreendida , utilizada na cultura, e como se faz sua circulação no social, aliás tais ponderações foram também feitas por Lippmam..
Ecléa bosi também apresenta como caracterísitca do estereótipo, a tendência a simplicação.No estereótipo tem-se então um resgate de generalidades, eliminação de promenores e detalhes.
Tais experiências são passíveis de superarem a esteretipia quando “a luz de novas experiências” checamos ou corrigimos as impressões generalizadoras iniciais.
A autora considera como destacável o período de socialização da criança, onde ali aparecem as imposições sociais, imbuídas garnde parte das vezes de estruturas estereotipadas, com um estreitamento do campo mental, pelas generalizações apreendidas sobre forma de estereótipos.
Capta-se as imposições dos valores sociais, sem maiores ponderações lógicas ou de objetividade.Se em decorrencia “disto, aparece o que a autora chama de “estreitamento mental”, também como resultante aparecem as submissões e integração social com uma consequente segurança social.
Eclea também partilhando de Heller aponta o coitidiano, como que permeado por esse carater de fugacidade, oque implementa o espiríto generalizador do estereótipo onde se vulgariza o conhecimento, no sentido de consumar seu aspecto superficial, elegendo o mecanismo da opnião, um senso comum ou da aparencia, como forma de verdade.
Schaf, por sua vez, nos seus Ensaios sobre a “Filosofia da Linguagem”, busca aclarar as nuances ou características do estereótipo , uma vez que as caracterizações procedidas sobre esse termo, segundo ele, leva a vinculá-lo a algumas categorias do conhecimento, tal como a do conceito.
Como fica as relações entre conceito e estereótipo?
Aquele autor mostra que tanto o conceito como o estereótipo se ligam a realidade da linguagem, da palavra, portanto do signo. Pelos signos emergem não só os conceitos como os estereótipos. Tal fato se deve a forma em que a representação engendra generalidades , tais como aquelas oriundas e pertinentes aos conceitos.
Assim para Schaff estão relacionados- palavra e conceito, como também palavra e estereótipo.
Afirma ainda o autor que sem conceitos não podemos pensar, ou que, sem palavras que tenham significados concretos é impossível se pensar. Contudo pode-se pensar sem estereótipos, pois estes não correspondem a uma categoria lógica do pensamento, mas sim do nível pragmático.
Sublinha ainda o mesmo autor que o estereótipo surge sobretudo quando se submete a linguagem - a jogos de valorações , vindo a causar demasaiadas generalizações , sem que ai se tenha uma equidade lógica. Podemos, às vezes submeter um conceito a situações deveras generalizadas ou demasiadamente ampla comprometendo o nível lógico do conceito, do pensamento, no que pese permitir uma aparente conformação pragmática.(Schaff:1975)
Exarceba-se pelo conceito uma conformação a um tal assertiva, que não corresponde a devida realidade. Esse talvez seja um dos vieses em que a palavra , como diz Shaff assume sua tirania, e assim o seu estereótipo.
Entendemos ao mesmo tempo que das valorações ocorridas no estereótipo , pode-se estar relacionando a correlações morais do grupo e da cultura , assim como produto de uma forma pre-categorial apressada do pensamento cotidiano submetido as emergências econômicas da pressa da expressão do pensamento.
Barthes ao discorrer sobre a língua, citando Jakobson, afirma que o idioma se define menos pelo que ele permite dizer, de que por aquilo que ele me obriga a diser. Sugere ainda aquele autor que-” falar não é comunicar” como se apregoa, mas sim é sujeitar, pois toda língua é um a “reição generalizada.”(Barthes:1983)
“
Para Barthes há um poder na língua que a torna fascista, pois ela obriga a dizer, e sublinha ele que em decorrência “ em cada signo dorme este monstro: o estereótipo.”
Eis o nosso destino enquanto sujeitos da linguagem, querer dizer pelo que já foi dito, ou querer dizer o novo através do que posso dizer pelo próximo conhecido- o conceito- ,mas que não é o mesmo que o novo.
Na verdade a linguagem tem o poder de alterar enquanto limitação do poder de representação, ao mesmo tempo ela é reflexo dos mecanismos da cultura, de seus valores, o que implica no mecanismo do estereótipo em ultrageneralizar. O estereótipo é assim um efeito da linguagem , que por sua vez é um efeito ideológico.
Das considerações apresentadas pelos diversos teóricos observamos a presença comum das seguintes características no estereótipo:
.um fenômeno do pensamento\linguagem
.um sentido de economia na formulação da idëia ou do fato ou comportamento
. o cotidiano como contexto propicio para a realização do estereótipo
.um mecanismo de generalização e simplificação. profunda, acenando para a opniào em detrimento da objetividade do conhecimento.
.um mecanismo que permite o aparecimento de alteraçào da realidade, nas suas condições de existência, ensejando o aparecimento das ideologias.
- LINGUAGEM - CORPO SIMBÓLICO \ SEXUALIDADE E ESTEREÓTIPOS.
‘A ANATOMIA É O DESTINO ‘ Freud
LINGUAGEM E PSICANÁLISE
Um dos estereótipos que ainda domina hoje no plano da sexualidade é o da sua correspondência a anatomia ou da genitalidade. A Sexualidade ficou arraiagada ao plano do anatômico, ou ainda na crença- estereótipada do “homem natural “, onde se construía uma outra falácia que era a do Homem- trans-histórico- e Universal..
Corpo- anatomia e genitalidade selavam o destino desse homem natural, decorrente das mentalidades do Sec XVII, de um pensamento mecanicista médico. A reprodução da espécie humana corroborava nesse homem natural, destinado a perpetuar a espécie, e esse destino dava-lhe adjetivação sexual, culminando entre a polaridade do macho e fêmea.
A ideologia magico religiosa- permeada pelos estereótipos míticos alicerçavam esse homem.
A ideologia dos cosmos oriunda do discurso mítico genético abria um discurso do macho e fêmea. De Gaia a Lilith ou Eva, de Urano a Eros ou Adão o traçado da sexualidade passava por um homem condenado a sua realidade corporal e anatômica.
A sexualidade identificada enquanto um fenômeno anatômico parecia então não ter história , uma vez que a história se escreveria sob a égide do homem, o homem natural, identificado apenas, pela sua genitália..
A revolução promovida na sexualidade através do discurso de Freud, fez aparecer uma concepção de uma psico-sexualidade. O anatômico não mais decidia aparecendo o caráter do psíquico que imprimiria a identidade sexual e a escolha do objeto sexual. A libido e as pulsões , a subjetividade e as neuroses constituiriam campo para que a Psicanálise inaugurasse um novo momento dentro “ Scientia Sexualis.”
Privilegiaria Freud o papel da linguagem, com algo que se faz impregnar ao indivíduo constituindo a esfera do desejo, e com isto a percepção do corpo atingido pela linguagem .
Com isso caem os estereótipos de um homem natural e apenas anatômico para se erguer a perspectiva de um corpo absorvido pela linguagem e conectado a cultura. O corpo agora é erótico, na e pela linguagem e transfigura-se pelo desejo e imaginação fantástica..
Ora, se antes os estereótipos da sexualidade se estabeleciam pela anatomia do corpo, negava-se a este corpo um significado advindo do psíquico, e que interferiria na sexualidade.
A revolução Freudiana, se dá através do privilégio não ao corpo, mas a linguagem imbutida no psíquico, e que reconstroi ou dar- novo significado ao corpo, instaurando a estrutura do inconsciente.
A psicanálise , como acentua Garcia-Roza , não parte do real- do corpo, mas da linguagem:
“Ela- a psicanálise não pressupõe um real identificado com o mundo, a partir do qual constrói o psíquico como lugar da representação. O real não é o mundo, e a tese que a psicanálise sustenta é a de que o real jamais terá lugar no mundo. O real é um suposto e não um dado”(Garcia-Roza:1990)
Desse modo podemos afirmar que se a linguagem é suporte para a lingüística, do mesmo modo a linguagem e o simbólico, bem como a representação se constituem embasamentos estruturais e estruturantes para a PSICANÁLISE.
Freud ao arquitetar o discurso psicanalítico, privilegiou a linguagem e o pensamento, que por decorrência estruturou o aparelho da linguagem e o Aparelho psíquico. Num e noutro são indispensáveis a estrutura da linguagem- da fala e da palavra, como algo que se internaliza, produz subjetividade e a noção do outro.
Da mesma forma a sexualidade se envolve com a linguagem através do Estudo das Pulsões, do Complexo de Edipo e da Interpretação dos Sonhos. Nessas três abordagens, pairam o vislumbre do aporte semiótico, da linguagem, ou na visão Lacaniana do significante.
Se com Freud a estrutura da Linguagem é fundante para o inconsciente , com Lacan, o estudo da linguagem e seus aportes semióticos são indispensáveis para um repensar o discurso Freudiano em bases científicas.
Lacan, trabalhou todo um manancial linguístico a sua época, ou seja de Saussurre, a Benveniste, Jakobson., privilegiando a linguagem, a ponto de expressar, a partir desses , um dos maiores fundamentos da descoberta freudiana, e reinterpretado por ele, ou seja: que o inconsciente se estrutura como linguagem
Corpo, corpo, corpo, verdade tão final sede tão varia- Drummond
A proposta Lacaniana de releitura a obra de Freud, além de ser um projeto que privilegia a linguagem, não negando os pressupostos de Freud, ele sublinha a condição semiótica do discurso, destacando a função do significante na Linguagem. Para isso ele parte da concepção Saussuriana do significante, mas a amplia, concebendo uma autonomia do significante. Lacan ao trazer uma nova concepção do significante encaminha seu projeto para uma teoria do sujeito ,ou da subjetividade, partilhada assim pelo significante-”
“Um significante é aquilo que representa um sujeito para outro significante” -Lacan_ (Juranville:1984)
O significante é para Lacan sobretudo o desejo que se estrutura numa dimensão tríade do real- do imaginário e do simbólico.
“ ... Primeiramente o real. Ele está ligado a tremporalidade intrínseca da cadeia significante...O real não é desejáve, é antes de mais nada o tempo durante o qual o desejado não surge. O real é sempre aquele do encontro faltoso, não apenas aquilo que nos faltou ao encontro pois o que na verdade faltou foi o objeto primordial impossível....O real é impossível...
...Em seguida o imaginário... o imaginário é , essencialmente , o confronto entre o pouco ser desejante e a plenitude antecipada do outro. Uma avaliação portanto.
...E finalmente o simbólico... que traz uma idéia de um reenvio a plenitude.”(Juranville:1987)
Em outras palavras, Lacan destaca a existência do real que seria uma hipótese , pois ele é inatingível. Já o imaginário que é o mundo da fantasia , dos fantasma , está perpassado pelo engendramento semiótico, desde as percepções primitivas do indivíduo deslanchando para o simbólico com a apreensão e domínio da linguagem verbal, e reinterpretação do imaginário..
Partindo do pressuposto que a Psicanálise concebida como ciência do psíquico, não exclui o corpo, é a partir de Freud com a queda do homem natural que declina o corpo natural , para entrar na perspectiva do corpo erógeno. O corpo biológico é assim capturado pelo simbólico. Aliás a apropriação do simbólico pelo corpo se dá antes mesmo do nascimento do corpo , a partir dos fantasma criados na expectativa do nascimento, e de criação de uma pré-identidade fantasmática pelo grupo que recebe o nascituro -um corpo.(Garcia-Roza:1990)
“O dado primeiro da psicanálise não é o corpo biológico, mas a linguagem....De fato o que Lacan chama de corpo do simbólico, ou corpo primeiro, é efeito dessa in-habitação da linguagem, que transforma o organismo vivo em corpo. Este foi o objeto da primeiras preocupações de Freud- o corpo da histérica....”(Garcia-Roza:1990)
O grande embate entre as concepções da Sexologia em voga à época de Freud e seu discurso propriamente dito eram:
.o que se concebia como perversões.. o homossexualismo
.o caráter genital da sexualidade- ou a normatividade da sexualidade.
.a pre-genitalidade na infância.
Freud rever o conceito de perversão, portanto de um estereótipo- como algo de monstruoso, e inumano, para assentar as bases da normalidade na perversão, ou seja nenhuma pessoa poderia deixar de “acrescentar algo de perverso ao objetivo sexual normal. Mais tarde Freud vem a conceber o caráter ambíguo ou de potencialidade bissexual no comportamento humano. Ao mesmo tempo era considerada perversa qualquer conduta que não leve a reprodução.Esclarece ai o psicanalista a função do prazer, do desejo que se acham presentes dentro da sexualidade, portanto não reduzindo a reprodução apenas.
Contesta também Freud a redução da sexualidade a genitalidade dizendo que tudo pode vir da imaginação, do desejo. Neste sentido ele é por uma nova moral, que privilegie antes de tudo a felicidade, portanto não buscando normatividades sexuais que não reconhecem a condição do psiquismo humano, e o caráter vasto da Sexualidade.
Com relação a sexualidade infantil ou a fase pré-genital, o discurso freudiano é escandaloso a época pois rompe com o caráter da infância do período, ao admitir a pré-história da sexualidade desde ali encrostada, e além do mais, Freud localiza as raízes do perverso e do auto erotismo. Aqui rompe Freud outra vez com o estereótipo em voga, ou seja da a pureza deificada da infância.
CONCLUSÃO
Refletir sobre o estereótipo , necessariamente é refletir sobre a linguagem, sua forma de implicacões conceituais, assim como pelo história das ideologias.
E se partimos para a área do estereótipo na sexualidade , necessariamente também nos implicamos naquelas categorias, e sobretudo com a questão Anátomo-patológica-médica e os novos paradigmas da Psicanálise.
Assim das categorias fundantes , que se implicam temos:
.A- o arcabouço da comunicação humana face a sexualidade.
.B- o da natureza humana - o homem e seu predicativo - o corpo.
.C- a ciência do corpo e do psiquismo
A história da comunicação humana é perpassada pelas história de um sujeito sexuado, destacado na linguagem e refletido na comunicação social.
O discurso na comunicação é perpassado por uma estrutura da linguagem, que o mobiliza para uma morfologia, sintaxe e semântica, o que implica dizer que há uma imbricação de gêneros e flexões resultantes com outras categorias que se flexionam, no discurso da linguagem..
ANA É ALTA- PEDRO ‘É ALTO
O sujeito do enunciado é um sujeito apriori definido pela palavra e por seu discurso comunicacional. Este sujeito já afirma uma sexualidade em potência, que lhe foi imposta pela linguagem e que é relacional a sexualidades dos outros a sua volta. O seu entorno comunicacional faz referência a linguagem que ele enuncia e correlaciona. O mundo em suas significações já lhes impõe um critério de gêneros, mesmo que sua sexualidade não seja ainda afirmada através de uma prática sexual..
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Se as flexões genéricas já lhe impõem tal acertiva , por outro lado seu nome , enquanto designo do masculino ou feminino também suscita o gênero e uma demanda futura da sexualidade. O seu nome designará sua comunicação com o mundo , com o outro, e com sua potência sexual ou dogenêrio. O seu nome suscita as concordâncias genéricas.
Assim o simbólico da linguagem remete a um gênero que já configura uma sexualidade em potência ou um estereótipo de uma sexualidades. Neste aspecto o gênero designa o sexo biológico , mas não designa o comportamento sexual.. Entretanto pelo gênero, a sociedade suscita igual ou correspondente comportamento sexual, o que se constitui um estereótipo.
Temos aí um apriori da linguagem e comunicação que busca proceder a NUANCES de uma identidade sexuada- verbalizada.
Somado a isto a mesma comunicação procede a leituras ou resgates da identificação visual do sujeito da comunicação que se retratam em suas performances gestuais.
Do ponto de vista dos estereótipos comunicados pela ideologia comunicacional temos o gênero- masculino, a exemplo correspondendo a um outro estereótipo da força, da destreza , da coragem, do poder.
Neste sentido estes estereótipos correspondem por assim dizer a segunda característica nossa que é a do homem natural- ou seja um macho e uma fêmea-..De um macho e fêmea reprodutores cerceado . Ou seja de uma sexualidade que é vislumbrada pela sua genitalidade reprodutora.
Neste sentido a carne - o corpo é o que prepondera nessa visão estereótipada da sexualidade, e que instaura um supremacia do biológico sobre o cultural, ou mesmo de um homem natural universal e sem uma história da sua sexualidade, apenas da sua reprodução..
Nestes termos do estereótipo da reprodução assim se refere Hightwater:
“a sobrevivência da espécie, por meio da reprodução, tornou-se o aspecto básico do nosso modelo de homens e mulheres, traduzindo assim a biologia em imperativos sócio-culturais. Dessa forma, não se vê o comportamento humano como o resultado do livre arbítrio, mas como uma reação necessária aos órgãos e hormônios sexuais.(Hightwater:1992)
Se antes da psicanálise a sexualidade se reduzia a um estereótipo corpo biofisiológico e em separado de uma alma, ela, a psicanálise volta a indagar deste estereótipo- ou dilema corpo e alma-
“o que a partir de Freud se constitui como um complicador é que tanto corpo quanto a alma terão que ser repensados em seu estatuto ontológico”(Rosa:1991)
Não existe para Freud a alma enquanto “forma a apriori, mas algo submetido ao dados sensíveis e materializados. Surge um corpo da linguagem- um corpo simbólico, submetido ao desejo.
O corpo freudiano é um corpo inscrito na linguagem , na fantasia e no desejo, portanto não é apenas um corpo que cumpre o mandato- estereótipo do instinto- ou para a reprodução , mas um corpo desejante. É um corpo que delira no prazer e no gozo, pelo viés da realização do desejo. Se há um gozo biofisiológico, ele ‘agora se reinscreve sobre a trama da linguagem, e assim do desejo. Enquanto isso os desejos não tem compromissos com a moral, o estereótipos talvez sim.
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