Delalves Costa- arquivo do autor * |
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Suicida-se o poeta de asas na bunda,
datilografa a puta, suja de encanto.
Seus olhos de vinho
derramados no anjo
que cegos não falam
a língua dos fatos...
Entendo como poesia, entre
outras tantas concepções, o sonho, o delírio do poeta, um desejo da condição de
fricção por estar e ser; é isto com todo humano, marcar-se, e nisto flagra-se o
dentro e o fora.
Acomodo a poesia como uma
espécie de dizedura que não traduz o
mundo, o homem, mas dessufoca e cria um real inatingível, mas que amolece com o
que dizemos, o que se diz real. Desatamano-nos ou seu contrário, a língua na
criação, e nos humanizamos. A palavra é afeto e o poema a busca do conatus, como diria Spinoza.
A poesia é o desejo de poder
traduzir o intraduzível, e nisto a linguagem cumpre um papel de expansão como
um bom inchaço. A palavra engorda, ou se enverga mais magra, todavia amplia-se
para o querer ser e dizer.
Delalves Costa -Osório, RS/1981. É um
poeta gaúcho que já tem uma língua e palavra esperta nas suas obras já postas. Seu
novo livro “Extemporâneo” (Ed Coralina, 2019) tece nova trama em que alterna-se
seu rugido de poeta na busca de seu estilo. A poesia é isto: busca nada, é
definitivo.
Costa
tem músculos fortes, mas por vezes duvida, como assim sempre é com quem
escreve, digo isto ao perceber a sua ruptura do dito real, ora com, ora sem
sombras de outros poetas, e aí surge sua criação qual estampido novo.
Os relógios suam,
fedem à poeira.
Desperto, homem sono em claro.
Em
sendo delirante, enquanto poeta, ele usa das ferramentas que tem – o vocábulo e
suas devidas ubicações e revolteios lexicais.
O ritmo na soleira do poema
me inventa...
A formiga bebe a goteira
na ranhura,
arrasta o rio
pelo silêncio,
acorda a página e me define.
Reafirmo,
redigo: Delalves sabe de sua indecisão e ao dizê-la faz a sua assunção de poeta
com vigor, sem precisar de sombras de árvores falantes já comidas e digeridas
como entre outros: Drummond.
Inconcluso – o Homendereço
No impulso onde se oculta à razão,
os meus con(fusos disfarces). Me
sinto estranho
a conceitos que outrora repudiava.
Parte do intelectual está
homendereço. Se penso
se não obedeço ou então me afasto
dos vultos é meu dilema! Pra cada
instante uma evidência: indecisão me
consome.
Aliás – vegeto morto-sobrevivente
ou pertenço ao futuro? Do relógio o
pior veneno:
adoeço no ventre (na mente), de
lógica e de caos
E
ele vai e vai... e se fortalece ao trapezear no verso e nisto sua musculatura
amalgamada de coragem ao sustentar sua palavra ensalivada o faz pegar o outro
lado do trapézio poemático.
O Invento
O ritmo na soleira do poema
me inventa...
A formiga bebe a goteira
na ranhura,
arrasta o rio
pelo silêncio,
acorda a página e me define. ...
Ao
adensar sua coragem vocabular e seu desenredo com não tessituras já consagradas
ele pulula forte e mostra o novo com o aço no fogo poemático. Dito de outro
modo, o poeta nas rupturas, nos seus buracos escondidos, despeja-se forte.
Seu
relógio sem ponteiros é mais exato, creia! Tu sabes apalavrar em suavidade, não
temas!
Digo
sem temor: há um poeta em curso que merece ser lido e viajado em seus alcances
múltiplos.
* Delalves Costa (13 de dezembro, 1981 –
Osório-RS) é poeta e escritor com participação em coletâneas e 7 livros de
poesia publicados, os mais recentes “Inacabamento,
a eterna gestação” (2016, Pragmatta) e “O
Apanhador de Estrelas” (Class, 2018). Membro e sócio-fundador da Academia
dos Escritores do Litoral Norte (AELN/RS).