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segunda-feira, 22 de maio de 2017

DRUMMOND NA PAREDE por Marcilio Godoi

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" drummond na parede
em itabira as sete faces do poeta se deixam entrever mais ou menos sutilmente. no amargor de ferro e ausência das montanhas exiladas, na alma pura de pedra de suas gentes, nos seus balcões desconfiados de longa espera, na topografia ondulante de seus opostos brancos, no jogo de suas casas de planos desfeitos, nos seus retorcidos de timidez e recusa, na serena carta de névoa de seus silêncios.
mas há ainda uma outra coisa que senti em itabira, uma funda abissal tristeza, parada na chaga da imensa flor em chamas que incendeia seu mapa ou o voo panorâmico sobre o seu solo, pele e corpo revirados por monstros carterpillar amarelos e crueis.
imaginava que a empresa que despeja dejetos mortais diariamente no desastre ambiental que antecipa sem disfarce algum em barragem dentro da cidade houvesse ao menos de cuidar da memória de seu filho mais célebre. qual nada.
constato que carlos drummond de andrade é, em itabira, e por assim dizer, um ilustre e um desconhecido. a cidade em geral guarda dele, não por sua própria culpa, claro está, uma visada confusa, prosaica, superficial, quase picaresca, recheada de causos, inverdades e rasas apressadas exegeses.
muito distantes e de certa forma negando a existência das idiossincrasias universais do autor de carta a stalingrado, os habitantes e visitantes da cidade não têm oportunidade acesso mediado às essenciais práticas de decifração das infinitas camadas de seu universo literário, seu caráter múltiplo e sequer, salvo guerreiras e honrosas exceções, desconfiam do descomunal valor se sua obra, hoje tomada na cidade sem uma curadoria integrada que exerça proporcionalmente a difusão plena e científica de suas complexidades, suas "inquietudes poéticas" para usar uma expressão de antonio candido.
foi com inconsolável desalento que constatei o olhar quase colegial, isolado, sobre o monumental legado drummondiano, em sua cidade natal. a despeito da ótima formação, da simpatia e do empenho abnegado dos atuais profissionais que lidam com seu espólio lírico expositivo, vê-se que estão todos de pés acorrentados e mãos atadas, sem orçamento, sem apoio de políticas, sem mediação, sem intercâmbio que promova a constante prática de decifração que o maior poeta brasileiro indiscutivelmente requer e merece.
tem casa, tem fazenda, tem memorial, tem centro cultural drummond em itabira. todos muito precariamente providos de um corte diagonal sobre a obra do poeta naquela que deveria ser a cidade-centro de sua inigualável referência, revelando-a dignamente em um conteúdo crítico à altura de seu povo, a todo visitante que nesse nosso vasto e complicado mundo procura desesperadamente pela dose de inigualável beleza presente no sentimento drummondiano."