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quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Ódio ao Bolsa Família e “doações” natalinas revelam a cara da “gente de bem”




http://bit.ly/2t7S9Ja


Ângela Carrato nos faz uma apreciação deste momento do País ; contempla as contradições que vão da Roda Viva do Brasil - Roda Gigante do Rio ao Bolsa Família e a miséria como presente de Natal.Sublinha ainda a autora A fome que avança no no nosso solo que a Geografia da Fome de Josué de Castro já nos apontava. Destaca Ângela a questão do ódio como algo imanente ao povo brasileiro , especialmente as Elites, Mídias  e claro o atual governo odiento.



Ângela Carrato: Ódio ao Bolsa Família e “doações” natalinas revelam a cara da “gente de bem”


por Ângela Carrato*, especial para o Viomundo
http://bit.ly/2t7S9Ja



EPISÓDIO 1 – A Roda Gigante do Rio de Janeiro, “a maior da América Latina”, foi inaugurada no início de dezembro. Uma volta de 18 minutos custa R$ 59. Caso a pessoa queira desfrutar a paisagem da cidade vista do alto com sua família e/ou amigos, o giro em cabine exclusiva sobe para R$ 259.

As filas para curtirem as emoções da “nova maravilha” são longas e não se tem notícia de reclamações contra os preços, que equivalem 60% do benefício mensal básico pago pelo Programa Bolsa Família (R$ 85,01).

EPISÓDIO 2 – Desde o início de dezembro, a maioria dos shoppings centers já estava enfeitada para o Natal.

Além do tradicional Papai Noel e dos símbolos natalinos – entre eles as anacrônicas neves e trenós puxados por renas em um país tropical – não faltaram também os espaços para doações.

Em Belo Horizonte, um dos mais sofisticados shoppings criou uma espécie de cercadinho para tal finalidade.

A coisa funciona mais ou menos assim: a pessoa entra no supermercado, compra do bom e do melhor para a ceia de Natal com a família e, na saída, antes de pagar, avista o cercadinho.

A pessoa então dá meia volta, coloca no já abarrotado carrinho de compras um pacote de biscoitos ou uma caixa de chocolate e vai toda feliz fazer a sua doação.

Não falta nem mesmo quem aproveite a oportunidade para elogiar a “ótima ideia” do shopping.

EPISÓDIO 3 – Em meados de novembro, muitos dos atuais frequentadores da Roda Gigante e outro tanto dos que agora fazem doações em shoppings não acharam nada demais em uma notícia publicada pela Folha de S. Paulo.

A notícia, veiculada na coluna Painel, dava conta de que o governo Bolsonaro pretende, a partir de 2020, começar a “desmamar” os beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF).

TRATAMENTO INJUSTO E DESRESPEITOSO

Sem citar quem foi ouvido e sem precisar o que é e como funciona o PBF, criado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2004, o jornal da elite paulista que se pretende “ilustrada”, afirma que a ideia é ir reduzindo o valor pago para os beneficiários assim que arranjarem emprego.

Não ocorreu a nenhum jornalista da Folha de S. Paulo ou de qualquer veículo questionar o uso altamente pejorativo do termo “desmamar” em relação aos mais pobres e, menos ainda, perguntar às autoridades econômicas do governo federal quando a tal geração de empregos terá início.

Isso porque a agenda ultraliberal colocada em prática pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, aponta para direção oposta: um em cada três brasileiros em condições de trabalhar está desempregado e a precarização do trabalho avança de forma acelerada.

Igualmente não se viu nenhum leitor da Folha indignado com o tratamento injusto e desrespeitoso adotado pelo jornal e pelo governo contra os mais pobres.

O substantivo desmamar significa, nesse contexto, tirar o hábito, suspender a dependência, como se os pobres fossem os responsáveis pelas grandes mamatas que sempre existiram e voltaram a acontecer com força no Brasil após a vitória do golpe, travestido de impeachment contra Dilma Rousseff, em 2016.

Mamatas que Bolsonaro e sua turma não param de ampliar, ao mesmo tempo em que congelam o salário-mínimo e estão fazendo de tudo para acabar com o Programa Bolsa Família.

MAMATA DAS MAMATAS

Como explicar os gordos reajustes salariais que setores do judiciário tiveram nos últimos três anos, apesar do país estar em crise?

Como explicar que parlamentares, juízes e militares tenham ficado fora da Reforma da Previdência?

Como explicar, ainda, que a Reforma da Previdência dos militares tenha sido, na prática, um novo plano de carreira para o setor, com oficiais tendo reajustes de até 40%?

Como explicar, igualmente, o perdão de dívidas que Bolsonaro concedeu ao agronegócio e aos bancos, sem que nenhum integrante do atual governo e a mídia corporativa brasileira considerassem isso “mamata”?

É importante lembrar ainda a mamata das mamatas, como devem ser chamados os leilões do pré-sal, que têm vendido o futuro do Brasil a preço de banana para empresas multinacionais.

Em dezembro de 2010, no apagar das luzes de seu segundo mandato, Lula conseguiu aprovar o regime de partilha para a exploração do pré-sal, garantindo a atuação da Petrobras como operadora única e partícipe prioritária dos leilões.

Quadro que Dilma tentou manter, apesar da pressão dos tucanos, encabeçada por José Serra.

Foi exatamente nesse momento, em 2013, que as manifestações contra ela tomaram corpo e não pararam mais.

Para Lula e Dilma, o pré-sal era o passaporte para os brasileiros conseguirem uma educação e saúde de qualidade, mas os golpistas jogaram tudo isso por terra.

Aliás, uma das razões para o golpe de 2016 foi exatamente tomar o pré-sal dos brasileiros.

E isso caro leitor, isso não é mera especulação ou opinião. Está documentado. Basta ler o livro de Eduard Snowden, Eterna Vigilância (Editora Paneta, 2019) ou assistir ao filme-documentário de Oliver Stone, Snowden (2016). Para os interessados, o filme está disponível na Netflix.

Em se tratando do governo Temer, é importante não perder de vista que ele, dando continuidade a esse processo, isentou as multinacionais do petróleo, através da lei 13.586, de 2017, do pagamento de uma cifra superior a R$ 1 trilhão.

A lei em questão concede isenções fiscais para empresas de petróleo estrangeiras, provocando perda de arrecadação do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), isso num momento em que os golpistas creditavam ao PT ter “quebrado o Brasil”.

Mas nada disso foi considerado “mamata” pela Folha de S. Paulo ou por qualquer outro veículo da mídia corporativa brasileira.

Todos, aliás, aplaudiram e pediram mais: a privatização da Petrobras, da Eletrobras e do Banco do Brasil.

Recuando-se ainda mais no tempo, é possível lembrar outras mamatas que caracterizaram o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, quando mais de 100 empresas estatais foram privatizadas.

O caso mais grave foi o da Companhia Vale do Rio Doce, vendida por R$ 3,3 bilhões, quando somente as suas reservas minerais eram calculadas em mais de R$ 100 bilhões à época.

Uma vez privatizada, a Vale é a mesma mineradora que já provocou dois crimes ambientais e humanos em Minas Gerais – em Bento Rodrigues e em Brumadinho – e se recusa a pagar as devidas indenizações às vítimas, aos municípios e ao meio ambiente por ela destruído.

A “CASA GRANDE” CONTRA OS MAIS POBRES

Como diria o jornalista Mino Carta, a classe dominante brasileira, que ele prefere chamar de “Casa Grande”, continua tratando os mais pobres como se eles fossem parte da “Senzala”.

Vale dizer: a “Casa Grande” continua achando que pode tudo contra os mais pobres, em sua grande maioria descendente de pretos e de índios, escravizados e dizimados no passado e ainda hoje.

Basta verificar as estatísticas envolvendo a cor e a classe social da maioria dos mortos pela polícia em batidas nos morros e aglomerados das metrópoles brasileiras.

Basta verificar, igualmente, a cor e a situação econômica dos que são alvos de chacinas, no campo, por pistoleiros a mando dos “senhores de gado e de gente” para se perceber o tamanho da discriminação e da desigualdade no Brasil.

Ao contrário do que a “Casa Grande” acredita e divulga, o pobre não é pobre porque é preguiçoso ou incapaz.

O que tem faltado aos pobres brasileiros, na maior parte dos 519 anos de existência do Brasil é condição para se desenvolver. Condição que não faltou aos colonos nos Estados Unidos que, cedo, receberam terras e incentivos para cultivarem sua fazenda ou sítio.

A reforma agrária naquele país tão decantada pelos ditos liberais brasileiros data de mais de 200 anos. A daqui, nunca saiu do papel.

Os Estados Unidos e também os principais países da Europa que, juntamente com o Japão fazem parte do chamado Primeiro Mundo, por mais de três décadas, entre os anos de 1946 e 1980, apoiaram através de uma série de programas sociais, os setores mais pobres de suas populações, no que ficou conhecido como welfare state, o Estado do Bem-Estar Social.

Foram essas políticas de cunho keynesiano (em referência ao economista inglês John Maynard Keynes que as criou) as responsáveis por países como Inglaterra, França, Alemanha e Itália terem conseguido se recuperar bem e rápido da destruição provocada pela Segunda Guerra Mundial.

Keynes (1883-1946) rompeu com a visão de livre-mercado em favor da intervenção estatal na economia, com a principal característica do Estado do Bem-Estar Social sendo a defesa dos direitos do cidadão.

A título de exemplo, entre as políticas colocadas em prática nesses países estavam muitas voltadas à habitação, educação, saúde, assistência social e segurança alimentar.

O ódio que a elite brasileira nutre contra Lula, portanto, está equivocado.

Nem ele e muito menos a esquerda brasileira inventaram o principal programa de renda de cidadania, conhecido como Bolsa Família.

O programa já havia sido criado há décadas pelos principais países capitalistas e se tornado uma das recomendações do insuspeito de qualquer flerte com socialistas e comunistas, Banco Mundial.

Renda de cidadania é parte do receituário do Banco Mundial para se superar a fome, a miséria e o subdesenvolvimento, mas a “Casa Grande” sempre preferiu desconhecer o assunto.

O grande mérito de Lula – e é mérito mesmo – foi o de ter dado forma, cara e a abrangência necessária ao programa de combate à fome no Brasil, que antes não passava de conversa para boi dormir.

GEOGRAFIA DA FOME

Desde o início do século XX que se falava em combate à fome no país.

Fome que foi das grandes responsáveis pelas levas de migrantes que deixavam o Nordeste em direção ao Sudeste e ao Sul por décadas a fio. Essas levas eram antecedidas por secas e sucedidas por farta liberação de verbas por parte do governo federal.

Os donos da “Casa Grande” pegavam essas verbas e o problema continuava, com esses senhores culpando o clima e os próprios atingidos.

Essa situação foi diagnosticada e denunciada pelo médico, cientista político, escritor e ativista, Josué de Castro (1908-1973) ao lançar em 1946 o livro Geografia da fome.

Obra clássica, o livro buscou tirar da obscuridade o quadro da fome no país, ao enfatizar as origens socioeconômicas da tragédia e denunciar as explicações deterministas que o naturalizavam.

Apesar de reconhecido por seu trabalho em todo o mundo, Josué de Castro, um dos primeiros dirigentes da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e também embaixador brasileiro junto à ONU, estava na primeira lista de cassados pelo AI-5, quando os militares deram o golpe dentro do golpe, em 1968.

Como Josué de Castro, Lula é pernambucano e se não estudou na universidade os problemas apontados por seu conterrâneo, os sentiu na pele como criança e através de sua família, obrigada a vir para o Sul na carroceria de um pau de arara.

Razões de sobra, portanto, tinha Lula para lançar um programa que não só combatesse a fome como garantisse dignidade e desenvolvimento aos mais pobres.

Mesmo com o reconhecimento mundial que o Programa Bolsa Família (PBF) rapidamente obteve, a “Casa Grande” nunca aceitou a sua existência e, mais do que isso, jamais deixou de combatê-lo.

Desde os primeiros tempos, o PBF foi rebatizado como “Bolsa Esmola” e seus beneficiários tidos como “preguiçosos” e “avessos ao trabalho”.

As mesmas acusações que a “Casa Grande”, no passado, imputou aos índios e depois aos negros por ela escravizados.

CRÍTICAS E PRECONCEITOS

Sou testemunha ocular do jogo sujo que a mídia corporativa brasileira sempre fez com o PBF e com todos que recebem esse benefício.

Durante cinco anos (2006-2010) coordenei a Assessoria de Comunicação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), na gestão de Patrus Ananias.

Quando cheguei lá, a mídia não escondia sua vontade de acabar o MDS, sob o argumento de que as políticas sociais “gastavam muito”.

A título de comparação, a atual folha anual de pagamentos do PBF é de R$ 29,5 bilhões, atendendo a um total de 13,2 milhões de pessoas.

Enquanto isso, a folha salarial anual do Poder Judiciário é de R$ 82,2 bilhões, contemplando um universo de apenas 448,9 mil pessoas.

Curiosamente essa mídia sempre considerou as políticas sociais como gasto e nunca como investimento na melhoria da vida da população brasileira, como são tidas em todos os países minimamente civilizados.

Já o dinheiro que a elite sempre obteve de programas governamentais voltados para a agricultura, pecuária, indústria e comércio, mesmo quando empregados em ações que não tinham nada a ver com a finalidade ao qual se destinavam, jamais foram alvo de críticas.

Basta lembrar os milhões que deveriam ter sido aplicados na agropecuária e na indústria brasileira e viraram apartamentos de luxo em Paris, Nova Iorque ou mesmo sofisticadas coberturas em Ipanema.

Apesar das estatísticas nacionais e internacionais apontarem, ano a ano, para o sucesso do PBF no que ele pretendia – quebrar o ciclo de pobreza inter-geracional, garantir escola e saúde para as crianças das famílias de baixa renda – a mídia brasileira nunca deu trégua em suas críticas.

Ao invés de noticiar e informar sobre um programa que garantia comida na mesa dos mais pobres o ano inteiro, a mídia insistia em tentar encontrar exemplos de corrupção entre os seus beneficiários, a fim de justificar o seu fim.

Como em qualquer atividade, também existia corrupção no PBF, mas ela nunca superou 0,0035 do total dos beneficiários, que chegou a alcançar 13,5 milhões de brasileiros.

A corrupção no PBF é das mais baixas de que se tem notícia no país e no mundo.

Mesmo assim, ela deve ser debitada à atuação de agentes das prefeituras encarregados de realizar o cadastro dos candidatos a beneficiários.

Se o processo começava truncado, não havia como, no MDS, em Brasília, isso ser detectado antes da primeira visita da equipe de saúde à família beneficiária.

A maioria esmagadora da população nunca soube e continua não sabendo disso.

Na época em que o PT estava no governo, o que a mídia mais fazia era insinuar que Lula controlava quem entrava no programa, quando eram as prefeituras de todos os municípios brasileiros, independente de qual partido estivesse no poder, as responsáveis pelo ingresso do interessado no Cadastro Único e, de lá, passar a ter acesso às políticas sociais do governo federal.

A mídia brasileira, aliás, nunca explicou nada sobre o que é e como funcionamento o PBF, limitando-se a criticá-lo sem qualquer argumento a não ser o preconceito alimentado pelas elites contra os mais pobres e contra qualquer governo que tente mudar esse quadro.

O ESCÂNDALO DO FOGÃO E DA GELADEIRA

Em meados de 2008 a campanha contra o BF ficou tão agressiva, com mentiras sendo ditas e repetidas quase diariamente pelos jornais O Globo, Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, além das revistas semanais (exceção para Carta Capital), que decidi recorrer ao site Observatório da Imprensa, na época, dirigido pelo jornalista Alberto Dines, para que pelo menos uma parcela do público tomasse conhecimento do que estava acontecendo.

E o que estava acontecendo era o seguinte: a mídia inventava casos de corrupção e não publicava os desmentidos que o MDS enviava.

Se não me engano, foi exatamente nessa época que o colunista de Política de O Globo, Merval Pereira, escreveu um texto acusando os beneficiários do PBF de estarem fazendo uma espécie de corrupção com o dinheiro que recebiam ao comprar fogão, geladeira e máquina de lavar ao invés de comida.

O referido colunista, que chegou a falar em escândalo, não tinha sequer se dado ao trabalho de ler o que determinava a lei que criou o PBF. Em momento algum estava disposto o que o beneficiário deveria fazer com o recurso.

Pelas pesquisas de que dispúnhamos, 90% utilizavam o benefício para alimentação, mas alguns casos também se valiam dele para comprar, em muitas prestações, fogões e geladeiras essenciais para o preparo e conservação dos alimentos.

Uma parcela ínfima o utilizava para gerar alguma renda, como no caso dos que compraram máquina de lavar e passavam a prestar serviços em sua comunidade.

Por essas e outras, Lula e o ministro Patrus sempre pensaram em transformar o PBF em uma política de Estado, para que não ficasse ao sabor dos interesses de cada governo.

Só que a correlação de forças no Congresso Nacional nunca ajudou. Naquela época, toda vez que o assunto era ventilado, uma espécie de campanha mais reforçada ainda contra o programa tomava conta da mídia e a ideia acabava adiada.

A presidente Dilma Rousseff deu continuidade ao PBF, enfatizando, através da Busca Ativa, chegar até os pobres mais difíceis de serem localizados e aos que menos conhecem – quando conhecem – os seus direitos: os moradores de rua nos grandes centros urbanos, os habitantes das fronteiras e dos locais quase inacessíveis, além de tribos indígenas e de quilombolas.

Para quem não sabe, os indígenas brasileiros e os descendentes de escravos também têm direito ao PBF.

A mídia, como sempre, nunca mostrou isso ao seu público e manteve o mesmo padrão de criticar e estigmatizar um direito de cidadania.

CARIDADE E ÓDIO

No governo Bolsonaro, que não esconde sua aversão aos pobres, a mídia corporativa brasileira se sente à vontade para propor o que sempre quis: acabar com o que ela considera “mamata”: alimentação e dignidade para quem precisa e interromper o ciclo de pobreza no país.

Isso sob o silêncio cúmplice daqueles para os quais torrar em 18 minutos dois terços do valor mensal do PBF não vale nada. Como não valem nada as doações que fazem a felicidade dos “cidadãos e cidadã de bem” nessa época natalina.

O que esses cidadãos de bem se esquecem é que as pessoas comem todos os dias e o que elas querem não é caridade, mas condições para terem acesso a uma vida melhor.

Para quem não sabe, uma criança que não ingerir a quantidade necessária de calorias por dia até os 7 anos de idade, está prejudicada para o resto da vida.

Depois, essa “Casa Grande” ou essa “elite do atraso”, como prefere denominá-la o sociólogo Jesse de Souza ainda vem falar em meritocracia ou das maravilhas da livre concorrência no mercado de trabalho.

Se depender de Bolsonaro, o PBF em 2020 será tão desfigurado que tende a acabar.

Na prática, ele já está destruindo o programa por dentro, ao reduzir ao máximo o número de pessoas que nele ingressam e ao reduzir e acabar com vários dos demais 19 programas que atuam junto com o PBF, envolvendo o contra-turno na escola para crianças e jovens, qualificação para mulheres e jovens, creches e os Centros de Assistência Social (CRAS).

Para quem rebate dizendo que Bolsonaro agora é a favor do PBF que tanto combateu, a ponto de ter instituído o 13º salário para o programa, isso prova exatamente o contrário.

Prova que ele não entendeu nada. O beneficio do PBF não é um salário que o governo paga a quem é pobre. É um direito que todo brasileiro pobre tem, é um direito de cidadania.

Ao instituir o 13º, o que Bolsonaro quer – e está conseguindo – é jogar os pobres contra os muito pobres, especialmente num país onde a precarização do trabalho cresce de forma exponencial. Mas esse é um assunto complexo, que fica para outro artigo.

Por agora basta pensar apenas, nesse dia de Natal, que a atual política econômica já devolveu o Brasil ao Mapa da Fome da ONU e que os mais de 20 milhões de brasileiros das classes D e E que tinham ascendido à classe C, estão de volta à miséria.

Mas nada disso preocupa as “pessoas de bem”. Elas dormirão tranquilas depois do passeio na Roda Gigante, de fazerem alguma caridade ou de ceiarem com a família e os amigos.

O ódio aos pobres ficará reservado para os outros dias do ano.

*Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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