Ao final do trajeto do Bloco Vem Para o Trem das Onze, uma moradora do Jaçanã foi agradecer à Marina Moreno por colocar de pé um bloco de carnaval nas ruas do bairro, uma vez que lhe faltam condições de levar os três filhos até o centro, “porque é o metrô, o ônibus, a pipoca”. Moreno, de 45 anos, é uma das oito fundadoras do grupo, que desfila todo sábado de carnaval, às 18h, no bairro da zona norte de São Paulo. Antes da criação do bloco, em 2012, o carnaval era apenas pela televisão para muitas pessoas dali.
O Bloco Vem Para o Trem das Onze é um dos 10 blocos que sairão, no carnaval deste ano, na região da Subprefeitura Jaçanã Tremembé. Pela primeira vez, a cidade paulistana terá desfiles de blocos de carnaval em todas as 32 prefeituras regionais.
Em 2020, de acordo com dados da Prefeitura de São Paulo, a quantidade de blocos cresceu 62% em relação ao ano passado, passando de 490 para 796. Em 2015, quando o carnaval de São Paulo começou a dar indícios de crescimento, foram 273 blocos. Apesar dos blocos estarem presentes em todas as subprefeituras neste ano, a região central ainda apresenta a maior concentração, onde o marketing e os investimentos são maiores, segundo Moreno. Somente na Sé, são 234. Logo atrás, vem Pinheiros, com 138 blocos.
No Jaçanã, é “um desafio atrás do outro”. O grupo de oito amigos começou com uma latinha de tinta na rua e dois foliões. No segundo ano, em 2013, conseguiram uma estrutura “um pouco melhor”: um carrinho de feira com uma caixa de som. “A ideia é dar força à comunidade, é fazer o morador entender que no bairro é possível fazer uma grande festa. Quando a festa chega no bairro e a comunidade se apropria fica tão bonito quanto em qualquer outro lugar. É importante isso acontecer na periferia. É importante o morador entender que ele pode fazer parte disso, não só na televisão”, afirma Moreno.
Wilson Café, de 43 anos e também fundador do Bloco Vem para o Trem das Onze explica que em oito anos foi possível criar uma identificação do bairro com o grupo, e vice-versa. Como o foco é Adoniran Barbosa, o grupo termina o desfile tocando o hino do compositor “Trem das Onze”. “Quando a gente vê o pessoal do bairro cantando parece diferente, eles cantam com uma energia de quem realmente mora em Jaçanã.”
Quando o bloco começou a ganhar corpo, Café conta que muita gente incentivava o grupo a tocar em outros bairros da cidade, como Pinheiros e Vila Madalena, na região central. “No bloco, as pessoas são do bairro. Todo mundo que toca é do bairro. Aí a gente vai sair do nosso bairro para tocar em outros bairros que têm uma demanda e um marketing mais forte? A nossa ideia é tocar para os nossos. Se nós somos da periferia, vamos tocar na periferia”, afirma Café.
O bloco, que hoje tem 30 integrantes e leva para as ruas em média 1000 moradores recebe um auxílio da Prefeitura de São Paulo com ambulâncias e banheiros químicos. Café, no entanto, defende que deveria haver também um apoio financeiro. Hoje, esse tipo de auxílio vem de comerciantes da região. “Mas aí é uma luta nossa.”
Tanto Marina Moreno quanto Wilson Café concordam é mais seguro curtir o carnaval da periferia do que o do centro. Café conta que um grupo de moradores jovens preferiu ir em um bloco em Pinheiros no dia do desfile do Bloco Vem Para o Trem das Onze. “Eles ficaram meio divididos, mas foram para lá. Eles voltaram arrependidos. Primeiro que lá não conseguiram curtir o carnaval, de tantas pessoas que tinha, não ouviam música, um deles teve o celular furtado. Entraram em um empurra e empurra, ficaram esmagados.”
A segurança também é um ponto destacado por Wagner Ufracker da Silva, o "Zé da Lua", de 43 anos e fundador do Bloco do Baião, de São Miguel Paulista, região leste de São Paulo. “Às vezes estando na periferia, tem mais segurança do que ir para o centro da cidade, porque às vezes você vai para o centro da cidade, tem arrastão. E na periferia não se vê tanto isso, porque as pessoas respeitam, é na comunidade”, afirma Silva, que mora em São Miguel Paulista desde que nasceu. No dia que o bloco sai na terça-feira de carnaval, os integrantes colocam brinquedos, máquinas de pipoca e de algodão doce nas ruas, criando um ambiente familiar.
Silva afirma que, assim como ocorre com o pessoal do Jaçanã, o carnaval de São Miguel Paulista também é um desafio quando o assunto é conseguir apoio financeiro, para além do auxílio da Prefeitura Municipal de ambulâncias e banheiros químicos.
O Bloco do Baião mostra a diversidade das periferias de São Paulo ao levar o forró para o carnaval. O bloco, que começou com cinco integrantes hoje tem cerca de 25, surgiu no centenário de Luiz Gonzaga, no dia 24 de junho de 2012, também dia de São João, na Praça do Forró, em São Miguel Paulista, onde a concentração de nordestinos é expressiva.
Edição: Lucas Weber
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