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quarta-feira, 28 de novembro de 2018

O voto com livro na mão-captura do Facebook- Regina Dalcastagnè

Quase sempre replico postagens de |Regina Dalcastagnè, e não se faz necessário maiores comentários.Este segue o mesmo princípio-leiam...abs Regina-Paulo Vasconcelos




Escrito por Regina Dalcastagnè e Rosilene Silva da Costa (imagem: Karina Freitas)

Regina replicou ,do Suplemento Cultural de Pernambuco matéria sua  e Rosilene Silva  Costa(https://bit.ly/2DUX7wG) para o seu face, aqui capturo,leiam abaixo-Paulo Vasconcelos.
O segundo turno das eleições presidenciais de 2018 no Brasil movimentou um material de campanha inusitado: os livros. Levados às urnas por eleitores de Fernando Haddad, não só expressavam apoio ao candidato, mas também serviam de protesto silencioso contra a campanha difamatória – encampada por Jair Bolsonaro, mas crescente no país nos últimos anos – em relação aos professores, aos artistas e aos intelectuais.
Essa eleição foi marcada pela disseminação de notícias, verdadeiras e falsas, pelas redes sociais. Muitas ações e reações dos eleitores também surgiram das redes, como o movimento Ele Não! – que nasceu de um grupo fechado, mas tomou as ruas do país. Foi neste contexto que a ideia de levar um livro para votar surgiu e se propagou rapidamente.
Como uma espécie de resposta às fotos e vídeos postados por eleitores de Jair Bolsonaro no primeiro turno, nos quais apareciam votando com armas, o movimento foi uma iniciativa espontânea, isto é, não partiu de marqueteiros, mas de eleitores comuns. Como ação de campanha, com certeza tinha potencial muito limitado, pois ocorreu no momento já da votação e apresentava um caráter talvez enigmático para quem não participava dele, seja por não acessar as redes sociais, seja por não entender o contexto político em que isso se deu. Assim, a ideia não era conquistar eleitores, já que dificilmente se viraria algum voto dessa forma. Seu sentido parecia ser mais estabelecer uma identidade e marcar, para aqueles que a compartilhavam, um compromisso de resistência. Porque, mesmo no caso da improvável vitória do candidato do PT, a resistência seria necessária – e o livro simboliza a resistência contra o anti-intelectualismo, a ignorância militante, a incultura, a barbárie e o silenciamento daqueles que pensam ou agem de forma diferente.
O livro tornou-se um emblema do candidato professor, assim como a arma era o de seu adversário. Livro versus arma, cultura versus violência, vida versus morte: o simbolismo é quase óbvio demais.
No dia da eleição, as pessoas postavam suas fotos com o título eleitoral e a obra escolhida nas mãos. Em seguida, alguns começaram a juntar as fotografias e elas já davam uma dimensão do alcance do movimento. Com o intuito de entender melhor a mensagem que se queria passar, organizamos uma espécie de levantamento dos livros selecionados, utilizando, também, as redes sociais como espaço para sua divulgação. Um questionário bastante simplificado foi preparado no Google Docs e disponibilizado em nossas páginas do Facebook, ficando aberto para respostas durante cinco dias.
A ideia nunca foi realizar uma pesquisa com base científica. Feito no calor do momento, o questionário tem fragilidades que logo se tornaram evidentes. Os respondentes não são uma amostra estatisticamente significativa; de fato, quanto mais próxima a pessoa estivesse de uma de nós nas redes sociais, maior a chance de tomar conhecimento do levantamento e dele participar. Em suma, é um divertimento interessado, motivado pela curiosidade e pelo desejo de produzir um registro um pouco mais estruturado deste movimento tão singular.
O alcance do levantamento foi maior do que esperávamos. No total, recebemos 8314 respostas. Conseguimos respostas de todas as unidades da federação e também de eleitores que votaram no exterior. Mas, uma vez que a amostragem não é científica, não dá para saber se de fato as porcentagens correspondem à adesão ao movimento pelo país. Foram 22% de respostas vindas de São Paulo, 17% do Rio de Janeiro, 10% do Rio Grande do Sul, 9% do Distrito Federal, 8% de Minas Gerais. Certamente a presença do DF em meio aos grandes colégios eleitorais é um viés da pesquisa, dado que é o local de moradia e trabalho das organizadoras. Cabe destacar que para responder ao questionário, a pessoa precisava estar autenticada ("logada") em sua conta no Google, assim, em tese, as respostas foram singulares, pois a mesma conta só poderia acessar o documento uma única vez.
O questionário foi respondido majoritariamente por mulheres (72%). As idades dos respondentes são muito variadas, incluindo de jovens de 16 anos a idosos. A maioria (85%) possui formação superior – incluindo aqui os 19% com doutorado. Outros 12% ainda estão na universidade. No entanto, nove pessoas com nível fundamental, completo ou incompleto também responderam ao questionário, bem como 288 pessoas com nível médio, concluído ou incompleto.
As profissões, como não poderia deixar de ser, tendo em vista não só os dados anteriores, mas também a natureza do movimento, estão especialmente vinculadas ao mundo acadêmico. Foram 2.913 respostas vindas de professoras/es, isto é, 35% do total, além de 1.021 de estudantes e outras 303 de outros profissionais ligados à educação. Profissionais da cultura somaram 617, da comunicação, 379, e da saúde, 287. Os servidores públicos, que estão sendo ameaçados e coagidos cotidianamente, somaram 845 respondentes.
Se entendemos esse gesto como algo que mobilizou especialmente pessoas vinculadas à educação, não é de se estranhar que o autor que mais frequentou as urnas tenha sido Paulo Freire. O educador pernambucano, que é com certeza o intelectual brasileiro mais admirado no mundo, tornou-se alvo preferencial do projeto ultraconservador Escola Sem Partido, que combate ostensivamente sua pedagogia crítica e emancipatória. Pois nada menos do que 700 respondentes disseram que levaram um livro de Paulo Freire consigo na hora de votar.
Outro nome importante da educação brasileira, Darcy Ribeiro, também apareceu bastante – 91 vezes – nas respostas ao questionário.
O segundo autor mais citado foi o sociólogo Jessé Souza, presente 246 vezes. Com forte atuação na denúncia do golpe de 2016 e do atual avanço da extrema-direita, Souza publicou nos últimos anos uma série de livros de intervenção no debate público. O título do mais citado pelos respondentes é, em si mesmo, um manifesto sobre a situação nacional e aquilo que a candidatura de Bolsonaro representava: A elite do atraso.
Em seguida, surgem os primeiros autores de ficção, ambos estrangeiros: José Saramago (176 citações) e George Orwell (167 citações). Não por acaso, a lista de livros destaca obras de ficção distópica. Além de Ensaio sobre a cegueira, de Saramago, e de 1984 e A revolução dos bichos, de Orwell, aparecem, entre os mais citados, Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, e O conto da aia, de Margaret Atwood, por exemplo.
O romance de Atwood se encaixa também em outro destaque do levantamento: a presença expressiva de livros que discutem a condição feminina. Muitos focando em especial as mulheres negras, como as obras de Angela Davis, Chimamanda Ngozi Adichie, Djamila Ribeiro, Conceição Evaristo e Carolina Maria de Jesus – mas também foram bem citadas a autobiografia de Malala Yousafzai, a biografia de Olga Benário e os diários de Anne Frank.
Eduardo Galeano, o quinto autor mais citado (158 menções), sinaliza outro aspecto da resistência literária nas urnas: a reivindicação de nossa identidade latino-americana. Em seguida, aparece o Projeto Brasil Nunca Mais, isto é, a autoria coletiva do primeiro grande mapeamento sobre as violações dos direitos humanos durante a ditadura militar, feito clandestinamente, ainda sob a vigência dela, sob a coordenação de líderes religiosos como o cardeal Paulo Evaristo Arns, o pastor Paulo Wright e o rabino Henry Sobel. As 140 citações ao livro Brasil: nunca mais se endereçam a um dos desdobramentos mais chocantes da campanha eleitoral: a entronização de um torturador, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, como “ídolo” do presidente eleito e de seus seguidores. Quando candidato, Bolsonaro chegou a dizer, em meio a gargalhadas, que as memórias do torturador eram seu livro de cabeceira.
Outras obras muito lembradas nas respostas ao levantamento também reagem, de maneira bastante evidente, à conjuntura imediata. A Bíblia marca uma oposição à instrumentalização da religião pela extrema-direita e a afirmação de uma compreensão diversa do que pode significar o cristianismo. A Constituição Federal é o texto produzido após o final da ditadura que consubstancia o pacto democrático, hoje em processo de dissolução. A verdade vencerá é a entrevista do ex-presidente Lula, cuja prisão, pelo futuro ministro da Justiça de Bolsonaro, foi determinante para o resultado eleitoral.
Marx frequenta a lista como representante máximo do projeto transformador e do pensamento crítico que a direita brasileira busca erradicar. Já autores cuja posição diante dos retrocessos atuais são no mínimo ambígua, como Elio Gaspari ou Zuenir Ventura, devem ter sido lembrados por posições anteriores ou pelo título de suas obras (o livro mais citado de Gaspari foi A ditadura envergonhada).
Vale ressaltar que a motivação dos leitores foi assunto de uma das perguntas do questionário e que 5014 pessoas responderam que o livro levado foi escolhido pelo que significava para elas, mas também para passar uma mensagem a quem via a obra em suas mãos.
Em suma: as listas com os autores e os livros mais citados, que seguem abaixo, trazem uma mistura interessante de obras que refletem sobre o país, mais especificamente sobre educação, autoritarismo, feminismo, racismo, direitos humanos e democracia. Mas não poderíamos deixar de citar aquelas obras que parecem ter sido levadas como uma declaração de afeto à literatura, como Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, A menina que roubava livros, de Markus Zusak, ou Dom Quixote, de Miguel de Cervantes.
Nem sempre o livro, louvado como objeto de cultura, de civilização, do que a humanidade é capaz de produzir de melhor, realmente emana tantas virtudes. O livresco pode ser também um mecanismo de elitismo e de exclusão. Mas, no dia 28 de outubro de 2018, no vasto e infeliz país chamado Brasil, o livro encarnou suas melhores qualidades e foi o símbolo vivo da inteligência, da diversidade, da educação, do pacto de resistência e, até, do amor que, esperamos, um dia realmente há de vencer o ódio.

AUTORES 
(a partir de 40 citações)
Paulo Freire – 700
Jessé Souza – 246
José Saramago – 176
George Orwell – 167
Eduardo Galeano – 158
Projeto Brasil Nunca Mais (Brasil: nunca mais) – 140
Hannah Arendt – 115
Angela Davis – 105
Machado de Assis – 97
Darcy Ribeiro – 91
Bíblia – 83
Margaret Atwood – 87
Karl Marx – 72
Djamila Ribeiro – 71
Gabriel García Márquez – 66
Chimamanda Ngozi Adichie – 65
Constituição Federal – 65
Márcia Tiburi - 65
Carolina Maria de Jesus – 62
Guimarães Rosa – 59
Graciliano Ramos – 56
Conceição Evaristo – 53
Elio Gaspari – 50
Carlos Drummond de Andrade – 49
Clarice Lispector – 49
Zuenir Ventura – 46
Anne Frank – 45

LIVROS 
(a partir de 20 citações)
Pedagogia do oprimido, de Paulo Freire – 256
Pedagogia da autonomia, de Paulo Freire – 213
A elite do atraso, de Jessé Souza – 192
Brasil: nunca mais, de Projeto Brasil Nunca Mais – 140
Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago – 124
As veias abertas da América Latina, de Eduardo Galeano – 107
1984, de George Orwell – 103
Bíblia – 83
Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis – 68
O povo brasileiro, de Darcy Ribeiro – 66
Constituição Federal – 65
O conto da aia, de Margaret Atwood – 64
A revolução dos bichos, de George Orwell – 58
Pedagogia da esperança, de Paulo Freire – 56
Mulheres, raça e classe, de Angela Davis – 54
Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus – 48
O diário de Anne Frank – 46
Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa – 45
1968: o ano que não terminou, de Zuenir Ventura – 42
Como conversar com um fascista, de Márcia Tiburi – 38
Origens do totalitarismo, de Hannah Arendt – 38
Ensaio sobre a lucidez, de José Saramago – 32
Fahrenheit 451, de Ray Bradbury – 32
O livro dos abraços, de Eduardo Galeano – 32
Eichmann em Jerusalém, de Hannah Arendt – 31
Quem tem medo do feminismo negro?, de Djamila Ribeiro – 31
Como as democracias morrem, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt – 30
O que é lugar de fala?, de Djamila Ribeiro – 29
A verdade vencerá, de Lula – 29
Vidas secas, de Graciliano Ramos – 29
A hora da estrela, de Clarice Lispector – 28
A tolice da inteligência brasileira, Jessé Souza – 28
Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro – 27
Eu sou Malala, de Malala Yousafzai – 26
Olga, de Fernando Moraes – 26
Admirável mundo novo, de Aldous Huxley – 25
Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez – 24
Educação como prática da liberdade, de Paulo Freire – 24
A ditadura envergonhada, de Elio Gaspari – 24
Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda – 24
A resistência, de Julián Fuks – 24
Casa grande e senzala, de Gilberto Freyre – 23
A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade – 23
O capital, de Karl Marx – 22
A condição humana, de Hannah Arendt – 21
Educação e mudança, de Paulo Freire – 21
A menina que roubava livros, de Markus Zusak – 21
Dom Quixote, de Miguel de Cervantes – 20

>> Regina Dalcastagnè é pesquisadora e professora (UnB), autora de Literatura brasileira contemporânea: um território contestado.
>> Rosilene Silva da Costa é pesquisadora (UnB). Possui experiência na área de Educação – trabalha com literatura, formação de professores e direitos humanos.

domingo, 25 de novembro de 2018

Carta aberta de um juiz federal à juíza substituta de Sergio Moro








A ditadura togada  manifesta-se na leitura do comportamento da Juíza substituta do Sr.Sérgio

Moro.Lembra-nos o Sr. Juiz da Bahia diante da empáfia da senhora juíza e que contamina,

ou tenta contaminar o povo com o viés de autoritarismo e que vem se expandindo no país.

O pragmatismo político trás a matéria abaixo. Paulo Vasconcelos (https://bit.ly/2RdiX1I)

Carta aberta juiz federal juíza substituta de Sergio Moro Lava Jato Lula
Gabriela Hardt (reprodução)
João Batista de Castro Júnior*
Antes da Lei 11.719/2008, que introduziu alteração no Código de Processo Penal, o réu era 
citado ordinariamente para ser interrogado por um magistrado acompanhado de um 
escrivão que digitava todas as frases começando sempre com “que”. Não raro um 
lapso condenatório do juiz e/ou do digitador escapava: “que, mesmo sendo verdade, 
insiste em dizer que não é verdade” etc.
Ainda nessa época, todo cuidado era pouco por parte do acusado, pois a recepção 
Judiciária ainda estava presa a intenso formalismo, quase que se assemelhando 
àquele antigo exemplo encontrável em Gaio (jurista romano que morreu em 180 da era 
cristã), nas suas famosas Institutas, de um indivíduo “agindo por causa de videiras 
cortadas”, o qual, ao dizer, perante o juiz, a palavra vites em vez de arbor, terminou por
 perder a ação, uma vez que a Lei de XII Tábuas falava de árvores cortadas em geral.

A Lei 11.719/2008 surgiu, então, para ser e reafirmar-se ser um marco miliário da teoria 
do processo penal: o interrogatório é primacialmente meio de defesa do réu 
e, secundariamente, meio de prova.

Dez anos já se foram, mas ainda tem juiz(íza) preso(a) ao passado, o que, tratando-se 
das práticas jurídico-judiciárias, não é novidade, pois as roupas continuam inadequadas 
ao climas dos trópicos, a linguagem insiste em imitar (mal, saliente-se) uma norma 
padrão própria do modelo gramatical do início do século XX, quando começou a 
parábola descendente do bacharelismo oco e retórico, os padrões litúrgicos teimam em 
ser fortemente rococó etc.

No ambiente virtual contemporâneo, esperava-se a adaptação dos magistrados a um 
novo modelo. Mas o que se viu no interrogatório de Lula hoje, dia 14 de novembro, 
foi o passadismo mostrando sua força na cena jurídica, ou seja, um acusado sendo 
tratado como condenado, não como réu que tem em seu favor a presunção de inocência.
Se Moro nunca esteve à altura de um cargo que exige imparcialidade, e isso se tornou
 mais que evidente ao aflorarem suas dissimuladas ambições políticas nos últimos dias, 
muito menos parece merecê-lo sua sucessora, a juíza federal substituta Gabriela Hardt, 
que, na audiência de interrogatório, mostrou toda sua inabilidade para pelo menos posar
 de imparcial ao vociferar: “senhor ex-presidente, esse é um interrogatório. E se 
o senhor começar nesse tom comigo, a gente vai ter um problema”.
]
Que problema, que problema, Gabriela? Se ao réu é dado até ficar em silêncio sem que 
-isso arranhe sua defesa, como assegura o Código de Processo Penal (art. 186, 
parágrafo único), como admitir que deva ter um tom para falar e um barema lexical do 
que possa dizer?

Pelo que se vê, está faltando mais esforço de credibilidade no caráter imparcial 
dos julgadores de Lula, porque, quando um juiz não é imparcial, mas tem que fingir 
sê-lo, deve ao menos fazer um melhor esforço teatral de demonstrar que o é.
Costuma-se ensinar em Análise do Discurso que o que se diz nem sempre é tão 
importante quanto a circunstância que envolve o não dito.

Ao declarar “se o senhor se sente desconfortável, o senhor pode ficar em silêncio”,
 a magistrada incriminou-se mais do que seguramente tentará fazer com Lula na 
sentença condenatória que está por vir, pois juiz algum pode induzir um acusado 
a ficar em silêncio, a não ser que tema que o depoimento constranja não só 
os acusadores como a mais recente e bizarra criação jurídica do direito 
brasileiro, nascida em Curitiba,o juiz-acusador.

Convenhamos: na encenação judiciária de baixo estofo que se instalou no caso Lula, 
morre-se de medo da paixão oratória dele, até no STF, que cometeu a atrocidade de 
vetar sua entrevista. Goste-se ou não, o ex-presidente humilhou Moro, que, perdido na 
sua ruminação de desforço vingativo, se deixava alimentar ainda mais pelo desejo 
de condenar a cada lance eloquente do interrogatório no caso do tríplex.

Agora, a juíza, temerosa de que a eloquência de Lula passasse também por cima 
dela,logo denunciou sua limitação intelectual: “se ele fugir do assunto e começar 
com discurso político, doutor, infelizmente, eu estou comandando a audiência e vou 
ter que cortar”.

O que você sabe, Gabriela, de discurso político? Sabe ao menos o significado dado 
pela Ciência Política? Não, né, não sabe, pois os manuais recheados de macetes 
com que se consegue aprovação em concursos da magistratura e do ministério 
público passam longe desse tipo de incursão.

Portanto, um réu pode falar o que quiser em seu interrogatório, desde que não 
produza ofensas, pois não se sabe qual é a estratégia de defesa. Portanto, a juiz algum 
é dado interferir nessa configuração defensiva, a menos que não disfarce seu 
propósito condenatório.

Mas vou ainda, Gabriela, lhe puxar a orelha com uma última lição sobre sua aberração 
de incitar o réu a ficar em silêncio. 
É bem provável que isso nunca chegue a seu conhecimento. Mas, vá lá, não vou me furtar 
de fazê-lo: quando, em um interrogatório,se induz ILEGALMENTE um réu a ficar em 
silêncio, quer-se no fundo produzir o que se conhece como argumentum ex silentio,
 ou seja, uma evidência presuntiva de que a pessoa deixou de mencionar algo 
embora estivesse em condições de fazê-lo.

Dou-lhe um exemplo clássico, porque conheço bem as limitações intelectuais da 
formação jurídica: nos seus diários, Marco Polo diz ter visitado a China, mas não 
cita a Grande Muralha, o que abriu uma enorme controvérsia historiográfica se teria 
mesmo estado naquela região.
Mas, antes de qualquer coisa, fique advertida da lição dada por Sven Bernecker e 
Duncan Pritchard: “argumentos pelo silêncio são, invariavelmente, bem fracos; há 
muitos exemplos onde este tipo de argumentação nos levaria a lugar nenhum” 
(The Routledge Companion to Epistemology, Routledge, 2012, p. 64-5).

Mas nós sabemos aonde as imputações contra Lula querem chegar, não é mesmo? 
Afinal, até o presidente eleito, que não detém qualquer poder legal sobre o assunto, 
mas é chefe de fato do juiz que encarcerou o ex-presidente, já declarou que este
 irá “apodrecer na cadeia”.

Em arremate: não é segredo como isso terminará e só me darei mesmo em breve ao 
trabalho de criticar os aspectos técnicos da anunciada futura sentença condenatória
 porque tenho muitos alunos e alunas interessados em conhecer as vísceras da
 estupidez jurídica que se abateu sobre o País.

*
João Batista de Castro Júnior é juiz federal e professor doutor do Curso de Direito ]
da Universidade do Estado da Bahia.
*NEGRITO EM NOSSA EDIÇÃO!

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Lendo o livro "Branco Vivo" Mais médicos por Aldo Ambrózio

Após uma leitura comovente do livro,tragando a narrativa passo a passo e me emocionar por diversas vezes,vejo um Brasil que ainda existe, como o da minha infância e com a humanidade a flor da pele.
A obra é um conjunto de crônicas que correm independente das fotos deslumbrantes e poemáticas de Araquém Alcântara.Mas cantam uníssonas num coro de exaltação ao viver
Corre a narrativa em paralelo com as ações dos Mais  Médicos.
Antonio Lino tem a sensibilidade de flagrar um Brasil miserável,mas salvo por incrível que pareça, pelo ato de humanidade e simplicidade do povo do interior do país.As mãos são juntas e de todos  os tipos,calosas ou não e se juntam às outras demais de  saber cientifico, mas não se dilaceram, ao contrário, se afagam: benzedeiras,parteiras, religiosos civis, anônimos com os  médicos do país de fora para sustentar a vida .Em meio a tragédia ou a festa alegre  o povo vive, ou transforma a vida.
Lino brinda o viver do homem e seus pares com a natureza : flora e fauna e os humanos numa ordem atávica.E tudo se completa na precariedade que é  a vida.
Flagro após isto o relato de Aldo Ambrózio que de outro modo-que não o meu, contempla a mesma obra.
Não tenho o que falar, pela proximidade com o Aldo, suas palavras bastam, leiam ! Paulo Vasconcelos





BRANCO VIVO-ANTONIO LINO -FOTOS ARAQUÉM ALCÂNTARA -ED.Elefante.



ALDO  AMBRÓZIO*

Perguntou Deleuze em (não deixa de ser histórico) 01 de maio de 1990 no artigo "Post-Scriptum sobre as sociedades de controle", artigo este que se tornou clássico para se retratar os tempos contemporâneos, animados pela governamentalidade neoliberal, se já se poderia "apreender esboços dessas formas por vir, capazes de combater as alegrias do marketing (DELEUZE, 1990, p 226). Essa pegunta ficou sem resposta ou obteve respostas fugidias, até o presente momento, tendo em vista a claudicância da possibilidade de se apresentar algo distinto da força totalitária das alegrias do marketing. 

Lendo o livro escrito por Antônio Lino e ornado pelas fotografias de Araquém Alcântara, nomeado "Branco Vivo", que traz, para o leitor, o frescor das formas de vida escutadas pelos operadores do programa mais médicos, fica aberto à percepção que estas formas de vida já existem espalhadas nos extremos e na parte forcluída do Brasil que não se duplica na imagem e semelhança do ordenamento segundo a forma vazia da frase que constrange a sua bandeira, qual seja, "ordem e progresso" que se duplica em jargões fascistas como "Brasil: ame-o ou deixe-o". 

O livro se abre em uma miríade de histórias paralelas que se mostram como sendo a força motriz dos agenciamentos que desejam constrangê-las ou destiná-las ao silêncio. Apesar de, aparentemente, o furor totalitário ter vencido uma batalha com o resultado das urnas, resta a pulsação destes outros brasis que não se encaixam nas propagandas dos serviços de turismo. O livro lembra a imagem de uma arraia, que no poema de Manuel de Barros nomeado "Agroval", com o início do período de secas, se fixa no redor dos brejos e se torna útero para um conjunto incerto de bichos e insetos. É como se um universo se constituísse, se destituísse e se reconstituísse segundo a pulsação das águas. 

Assim parece com as formas de vida nomeadas com elegância e precisão neste livro cirúrgico: os médicos retornaram para o seu país de origem devido ao furor totalitário do atual clima político brasileiro, não obstante, as formas de vida lá continuam e, espero, exijam, do aspirante a governante, a devida escuta e cuidado que outrora lhes foram dados! Às vezes, é com estes pequenos gestos que se produzem as grandes revoluções! Quem sabe?

*Psicanalista, Dr.em-Psicologia Clínica PUC-SP, autor de livro Empresariamento da Vida- Ed. Apris, com  diversos artigos publicados no Brasil e fora , prof.UFSCar- DCHE, Pós- doutorando em História Cultural, IFCH UNICAMP SP

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Primeiro Forum Mundial do Pensamento Crítico da esquerda discute vitória de Bolsonaro





Aqui uma prévia com Nicolás Trotta -reitor da Uni Metropolitana BA-um dos promotores do evento (e da CLACSO) e Pablo Gentili,argentino há  muito tempo  radicado no Brasil professor da UERJ. 

Aqui Dilma Roussef



Com depoimentos já acontecidos, neste fórum , gostaria de destacar os de :Christina Kirchner- Juan Grabois-AR Joana Mortágua,PT,Gustavo Pedro-COL, Dilma Rousseff, Gutemberg Farias-Br e  da chilena-Beatriz Sanchez- Chl,esta última denunciando a morte  de Camilo Catrillanca, afora os gritos de LULA LIVRE.




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Deixo com vocês a matéria -abaixo da RFI -de Márcio Rezende.
https://bit.ly/2DPkGqX
Diante do avanço da direita no mundo e particularmente na América do Sul, acontece a partir desta segunda-feira (20) em Buenos Aires o primeiro Foro Mundial do Pensamento Crítico. Um dos principais tópicos será o impacto da vitória de Jair Bolsonaro no Brasil que causou surpresa generalizada na região.

Marcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Os ex-presidentes Dilma Rousseff, Cristina Kirchner e José Mujica são as estrelas do encontro que terá ainda os ex-candidatos Fernando Haddad, Manuela D'ávila e Guilherme Boulos. O Foro Mundial do Pensamento Crítico terá mais de 200 convidados expositores entre ex-presidentes de esquerda, intelectuais progressistas internacionais e líderes de movimentos sociais.
Os debates incluem o futuro da democracia, ameaçada pela desigualdade social e pelo surgimento de líderes da extrema direita, o mais ilustrativo de todos é o presidente eleito, Jair Bolsonaro. O Foro pode ser uma oportunidade para a autocrítica da esquerda que soma derrotas eleitorais desde 2015. A reunião é também uma espécie de resposta antecipada à Cúpula de líderes do G20 que vai acontecer na capital argentina dentro de 10 dias.
O evento é organizado pelo Conselho Latino-americano de Ciências Sociais, a CLACSO, e vai até sexta-feira, mas os dois primeiros dias são os que concentram os principais expositores. A ex-presidente Dilma Rousseff abre o encontro com o painel "Democracia, cidadania e estado de exceção".
Também terão destaque os ex-presidentes do Uruguai, José Mujica; da Argentina, Cristina Kirchner; e da Colômbia, Ernesto Samper. Estarão ainda acadêmicos de diversos países e referentes da esquerda mundial como o líder espanhol do Podemos, Pablo Iglesias. O Foro acontece em um pequeno estádio com capacidade para dez mil pessoas, mas são mais de 50 mil inscritos. Muita gente vai acompanhar através de telões do lado de fora.
Vitória de Bolsonaro no Brasil é um dos pontos centrais
A recente vitória de Jair Bolsonaro no Brasil é um dos pontos centrais do evento. As lideranças políticas vão debater o assunto em diversos painéis. Por exemplo, o ex-presidente uruguaio, José Mujica, vai protagonizar o debate "América Latina: medo, esperança e utopia".
Já os candidatos brasileiros derrotados nas últimas eleições, Fernando Haddad, Manuela D'ávila e Guilherme Boulos vão apresentar o painel "Brasil, a esperança vencerá o medo". Há três anos exatamente, desde a vitória de Mauricio Macri aqui na Argentina em 2015, todas as eleições na América do Sul foram ganhas pela direita, mas nenhuma foi tão surpreendente quanto a de Jair Bolsonaro no Brasil.
O Foro do Pensamento Crítico é também apelidado de "Contra-Cúpula" porque nos próximos dias 30 de novembro e 1 de dezembro haverá aqui em Buenos Aires a reunião dos líderes do G20. O evento é uma oportunidade para a esquerda reagir ao crescimento das forças conservadoras e apresentar estratégias que invertam essa tendência. O Foro não é necessariamente uma crítica aos adversários, mas critica as próprias práticas da esquerda. Nesse reconhecimento de erros, aparece a corrupção estrutural, o financiamento ilegal de campanhas e a falta de reformas estruturais depois de mais de 12 anos de governos de esquerda.
O objetivo dos palestrantes será contribuir com soluções aos problemas globais. O evento também pode ajudar a canalizar as propostas de reconstrução e servir como um âmbito para a troca de ideias entre políticos, líderes sociais e acadêmicos. Mais do que o Foro em si, é a vitória da extrema direita que pode ter um efeito de unificação da esquerda, hoje fragmentada. Uma unificação contra o mal maior. Nesse sentido, Jair Bolsonaro aparece como o inimigo favorito para os líderes de esquerda da região porque representa o estereótipo da direita autoritária contra a qual esses líderes de esquerda construíram as suas carreiras políticas.

Nobel alternativo de literatura

Não creio  muito nestes tipos de prêmios, mas aqui vai.Na verdade estas premiações alternativas nada mais são estratégias de marketing dos editores para vender....vender.Não vai aqui críticas aos autores.Paulo Vasconcelos







Patti Smith, emocionada em sua atuação na cerimônia de entrega do Prêmios Nobel.  AFP

Nobel alternativo de literatura: muitas mulheres e nenhum autor de língua portuguesa na lista

https://bit.ly/2PGB1o7

J.K. Rowling, Margaret Atwood, Patti Smith, Chimamanda Ngozi Adichie e Don DeLillo estão entre os 46 indicados ao prêmio, que será decidido em outubro



 Patti Smith, Margaret Atwood, Chimamanda Ngozi Adichie, Don DeLillo, Neil Gaiman e Louis Édouard estão entre os 46 candidatos que disputarão o Prêmio Nobel Alternativo, uma iniciativa concebida por uma centena de escritores, atores, jornalistas e outras figuras culturais depois da inédita decisão da Academia Sueca de não entregar o Prêmio Nobel de Literatura em 2018, por causa do escândalo de abusos sexuais que envolveram o dramaturgo Jean-Claude Arnault, vinculado à instituição através de seu clube literário e marido de uma de suas integrantes, Katarina Frostenson. O prêmio deixou de ser concedido em sete ocasiões: 1914, 1918, 1935, e entre 1940 e 43.
Uma nova instituição, chamada New Academy, entregará o seu próprio prêmio em 14 de outubro, seguindo o mesmo cronograma do Nobel oficial. “Fundamos a New Academy para recordar que a literatura e a cultura, em geral, deveriam promover a democracia, a transparência, a empatia e o respeito, sem privilégios, preconceitos por arrogância ou sexismo”, disseram seus membros ao jornal britânico The Guardian em julho do ano passado.
Entre os indicados também estão Paul Auster, Haruki Murakami e Oz Amos, embora mais de metade seja de mulheres. E nenhum escritor em língua portuguesa. O objetivo da New Academy é procurar escritores que tenham contado a história “dos seres humanos no mundo”, em contraste com o Nobel, que tem a intenção de honrar o autor que tiver escrito, nas palavras do testamento de Alfred Nobel, “a obra mais destacada em uma direção ideal”.
A New Academy lançou nesta quinta-feira a votação pública, e os quatro autores mais populares serão submetidos ao escrutínio de um júri dirigido por Ann Pålsson (editora), Lisbeth Larsson (professora da Universidade de Gotemburgo) e Gunilla Sandín (bibliotecária). O ganhador será anunciado em outubro, o mesmo mês em que tradicionalmente se concede o Nobel.



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domingo, 18 de novembro de 2018

Brasileiros que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil!


 



'O Brasil foi o ultimo país do Ocidente a abolir a escravidão. Fonte-BBC-Museu Paulista USP



Nos dias  que ora atravessamos, é importante a Leitura desta matéria da BBC. BR.Apesar de sermos um dos países de maior população negra e com milhões de descendentes,  mesmo amorenados e ou branqueados pela miscigenação, não nos reconhecemos como tal. Poucos sabemos de nós, de nossa história, mas a genética é fatal.O país esconde ser um dos mais preconceituosos do mundo e persegue, prende e mata. Fomos atrasados na Abolição e firmamos leis hipócritas que não se cumprem. Escondemos líderes que lutaram pelo fim da escravatura, como estes apontados aqui, na reportagem abaixo.Poucas homenagens são feitas a Zumbi dos Palmares.Não temos memória e, portanto, não exercemos nossa democracia cidadã.Muito se falou dos negros na economia do nordeste, entretanto,  nada, quase nada se alude a participação de nós negros na economia sudestina especialmente em São Paulo, na economia cafeeira, açucareira e dos laranjais.O mesmo ocorrendo no Rio de Janeiro, e de igual modo no Paraná,Santa Catarina e Rio Grande do sul.Depois do nordeste o sudeste tem a maior população negra, mas não nos enxergamos como tal.vide-https://bit.ly/2Gze2lk.



Muito além da princesa Isabel, 6 brasileiros que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil






Ilustração brasileiros que lutaram contra a aboliçãoDireito de imagemANDRÉ VALENTE | BBC BRASIL
Image captionBatalha pela abolição já ocorria nas províncias brasileiras anos antes da assinatura da Lei Áurea, e reunia escravos, negros libertos, pessoas da classe média e da alta sociedade

O fim da escravidão no Brasil completa 130 anos em 13 de maio deste ano. Em 1888, a princesa Isabel, filha do imperador do Brasil Pedro 2º, assinou a Lei Áurea, decretando a abolição - sem nenhuma medida de compensação ou apoio aos ex-escravos.
A decisão veio após mais de três séculos de escravidão, que resultaram em 4,9 milhões de africanos traficados para o Brasil, sendo que mais de 600 mil morreram no caminho.
Mas a abolição no Brasil está longe de ter sido uma benevolência da monarquia. Na verdade, foi resultado de diversos fatores, entre eles, o crescimento do movimento abolicionista na década de 1880, cuja força não podia mais ser contida.
Entre as formas de resistência, estavam grandes embates parlamentares, manifestações artísticas, até revoltas e fugas massivas de escravos, que a polícia e o Exército não conseguiam - e, a partir de certo ponto, não queriam - reprimir. Em 1884, quatro anos antes do Brasil, os Estados do Ceará e do Amazonas acabaram com a escravidão, dando ainda mais força para o movimento.
A disputa continuou no pós-libertação, para que novas políticas fossem criadas destinando terras e indenizações aos ex-escravos - o que nunca ocorreu.




Luís Gonzaga Pinto da Gama nasceu em 1830, em Salvador, filho de mãe africana livre e pai branco de origem portuguesa. Quando o menino tinha quatro anos, sua mãe, Luísa, teria participado revolta dos Malês, na Bahia, pelo fim da escravidão.
Uma reviravolta ocorreu quando Gama tinha dez anos: ficou sob cuidados de um amigo do pai, que o vendeu como escravo. O menino "embarcou livre em Salvador e desembarcou escravo no Rio de Janeiro", escreve a socióloga Angela Alonso no livro Flores, Votos e Balas, sobre o movimento abolicionista. Depois, foi levado para São Paulo, onde trabalhou como escravo doméstico. "Aprendi a copeiro, sapateiro, a lavar e a engomar roupa e a costurar", escreveu o baiano.




Retrato de Luís Gama, o ex-escravo que se tornou advogado de escravosDireito de imagemACERVO BIBLIOTECA NACIONAL - BRASIL
Image captionCalcula-se que Luís Gama tenha ajudado a libertar cerca de 500 escravos

Aos 17 anos, Gama aprendeu a ler e escrever com um estudante de direito. E reivindicou sua liberdade ao seu proprietário, afinal, nascera livre, livre era.
Em São Paulo, Gama se tornou rábula (advogado autodidata, sem diploma) e criou uma nova forma de ativismo abolicionista: entrava com ações na Justiça para libertar escravos. Calcula-se que tenha ajudado a conseguir a liberdade de cerca de 500 pessoas.
Gama usava diversos argumentos para obter a alforria. O principal deles era que os africanos trazidos ao Brasil depois de 1831 tinham sido escravizados ilegalmente. Isso porque naquele ano foi assinado um tratado de proibição do tráfico de escravos. Mais de 700 mil pessoas tinham entrado no país nessas condições. Apenas em 1850 o tráfico de escravos foi abolido definitivamente.
"As vozes dos abolicionistas têm posto em relevo um fato altamente criminoso e assaz defendido pelas nossas indignas autoridades. A maior parte dos escravos africanos (...) foram importados depois da lei proibitiva do tráfico promulgada em 1831", disse Gama na época.
O advogado ainda entrou com diversos pedidos de habeas corpus para soltar escravos que estavam presos, acusados, sobretudo, de fuga. Ainda trabalhou em ações de liberdade, quando o escravo fazia um pedido judicial para comprar sua própria alforria - o que passou a ser permitido em 1871, em um dos artigos da Lei do Ventre Livre.
Luís Gama morreu em 1882, sem ver a abolição. Seu funeral, em São Paulo, foi seguido por uma multidão. "Quanto galgara Luís Gama, de ex-escravo a morto ilustre, em cujo funeral todas as classes representavam-se. Comércio de porta fechada, bandeira a meio mastro, de tempos em tempos, um discurso; nas sacadas, debruçavam-se tapeçarias, como nas procissões da Semana Santa", relata Alonso.
Na hora do enterro, alguém gritou pedindo que a multidão jurasse sobre o corpo de Gama que não deixaria morrer a ideia pela qual ele combatera. E juraram todos.

Maria Tomásia Figueira Lima, a aristocrata que lutou para adiantar a abolição no Ceará

Filha de uma família tradicional de Sobral (CE), Maria Tomásia foi para Fortaleza depois de se casar com o abolicionista Francisco de Paula de Oliveira Lima. Na capital, tornou-se uma das principais articuladoras do movimento que levou o Estado a decretar a libertação dos escravos quatro anos antes da Lei Áurea.
Segundo o Dicionário de Mulheres do Brasil, ela foi cofundadora e a primeira presidente da Sociedade das Cearenses Libertadoras que, em 1882, reunia 22 mulheres de famílias influentes para argumentar a favor da abolição.
Ao fim de sua primeira reunião, elas mesmas assinaram 12 cartas de alforria e, em seguida, conseguiram que senhores de engenho assinassem mais 72.
As mulheres conseguiram, inclusive, o apoio financeiro do imperador Pedro 2º para a iniciativa. Juntamente com outras sociedades abolicionistas da época, elas organizaram reuniões abertas com a população, promoviam a libertação de escravos em municípios do interior do Ceará e publicavam textos nos jornais pedindo a abolição em toda a província.
Maria Tomásia estava presente na Assembleia Legislativa no dia 25 de março de 1884, quando foi realizado o ato oficial de libertação dos escravos do Ceará, que deu força à campanha abolicionista no país.




Pintura da sessão parlamentar que aboliu a escravidão no Ceará, em 1884; há homens e mulheres dentro do ParlamentoDireito de imagemACERVO BIBLIOTECA NACIONAL - BRASIL
Image captionNessa pintura da sessão parlamentar que aboliu a escravidão no Ceará, em 1884, é possível ver diversas mulheres entre os homens

André Rebouças, o engenheiro que queria dar terras aos libertos

André Rebouças nasceu na Bahia, em 1838, em uma família negra, livre, e incluída na sociedade imperial. Quando jovem, estudou engenharia e começou a trabalhar na área. Foi responsável por diversas obras de engenharia importantes no país, como a estrada de ferro que liga Curitiba ao porto de Paranaguá. Conquistou posição social e respeito na corte. A Avenida Rebouças, importante via em São Paulo, é uma homenagem a André e a seu irmão Antonio, também engenheiro.
Em uma das obras de que participou, outro engenheiro pediu que Rebouças libertasse o escravo Chico, que era operário e tinha sido responsável pelos trabalhos hidráulicos. "Foi quando sua atenção recaiu sobre o assunto", escreve Angela Alonso, também em Flores, Votos e Balas. Chico foi, então, libertado.
"Sou abolicionista de coração. Não me acusa a consciência ter deixado uma só ocasião de fazer propaganda para a abolição dos escravos, e espero em Deus não morrer sem ter dado ao meu país as mais exuberantes provas da minha dedicação à santa causa da emancipação", discursou certa vez Rebouças, na presença do imperador Pedro 2º.




Retrato de André RebouçasDireito de imagemMUSEU AFRO BRASIL
Image captionAndré Rebouças era adepto de uma reforma agrária que concedesse terras para os ex-escravos

Na década de 1870, Rebouças se engajou na campanha pelo fim da escravidão. Participou de diversas sociedades abolicionistas e acabou se tornando um dos principais articuladores do movimento. Um de seus papéis foi fazer lobby - uma ponte entre os abolicionistas da elite e as instituições políticas, para quem executava obras de engenharia.
As ideias de Rebouças incluíam não apenas o fim da escravidão. Ele propunha que os libertos tivessem acesso à terra e a direitos, para serem integrados, não marginalizados. "É preciso dar terra ao negro. A escravidão é um crime. O latifúndio é uma atrocidade. (...) Não há comunismo na minha nacionalização do solo. É pura e simplesmente democracia rural", proclamou Rebouças.
O engenheiro também se opunha ao pagamento de indenização para os senhores de escravos em troca da liberdade - para Rebouças, isso seria uma forma de validar que uma pessoa fosse propriedade da outra.
Apoiador da monarquia e da família real brasileira, Rebouças foi ainda um dos responsáveis pela exaltação da Princesa Isabel como patrona da abolição.

Adelina, a charuteira que atuava como 'espiã'

Filha bastarda e escrava do próprio pai, Adelina passou a vender charutos que ele produzia nas ruas e estabelecimentos comerciais de São Luís (MA). Suas datas de nascimento e morte não são conhecidas. Seu sobrenome, também não.
Como escrava criada na casa grande, Adelina aprendeu a ler e escrever. Trabalhando nas ruas, assistia a discursos de abolicionistas e decidiu se envolver na causa.




Ilustração AdelinaDireito de imagemANDRÉ VALENTE | BBC BRASIL
Image captionComo não há registros fotográficos de Adelina, a charuteira, ilustração foi baseada em fotografias de escravas minas que viviam no Maranhão na época

De acordo com o Dicionário da Escravidão Negra no Brasil, de Clóvis Moura (Edusp), Adelina enviava à associação Clube dos Mortos - que escondia escravos e promovia sua fuga - informações que conseguia sobre ações policiais e estratégias dos escravistas.
Aos 17 anos, Adelina seria alforriada, segundo a promessa que seu senhor fez a sua mãe. Mas, segundo o Dicionário, isso não aconteceu.

Dragão do Mar, o jangadeiro que se recusou a transportar escravos para os navios

O jangadeiro e prático (condutor de embarcações) Francisco José do Nascimento (1839-1914), um homem pardo conhecido como Dragão do Mar, foi membro do Movimento Abolicionista Cearense, um dos principais da província, a primeira do Brasil a abolir a escravidão.
Em 1881, o Dragão do Mar comandou, em Fortaleza, uma greve de jangadeiros que transportavam os negros e negras escravizados para navios que iriam para outros Estados do Nordeste e para o Sul do Brasil. O movimento conseguiu paralisar o tráfico negreiro por alguns dias.




Ilustração Dragão do MarDireito de imagemANDRÉ VALENTE | BBC BRASIL
Image captionFrancisco José do Nascimento se recusou a transportar escravos das praias de Fortaleza para navios negreiros

Com o comércio de escravizados impedido nas praias do Ceará, Nascimento foi exonerado do cargo, segundo o registro de Clóvis Moura. E se tornou símbolo da batalha pela libertação dos escravos.
Depois da abolição, ele tornou-se Major Ajudante de Ordens do Secretário Geral do Comando Superior da Guarda Nacional do Estado do Ceará e morreu como primeiro-tenente honorário da Armada, em 1914.

Maria Firmina dos Reis, a primeira escritora abolicionista

A maranhense Maria Firmina (1825-1917) era negra e livre, "filha bastarda", mas formou-se professora primária e publicou, em 1859, o que é considerado por alguns historiadores o primeiro romance abolicionista do Brasil, Úrsula. O livro conta a história de um triângulo amoroso, mas três dos principais personagens são negros que questionam o sistema escravocrata.
A escritora assinava o livro apenas como "Uma maranhense", um expediente comum entre mulheres da época que se aventuravam no mercado editorial, e só agora começa a ser descoberto pelas universidades, segundo a professora de literatura brasileira da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Constância Lima Duarte.




Ilustração Maria FirminaDireito de imagemANDRÉ VALENTE | BBC BRASIL
Image captionRomance de Maria Firmina dos Reis é considerado o primeiro a trazer o ponto de vista de personagens negros no Brasil escravocrata

Maria Firmina também publicava contos, poemas e artigos sobre a escravidão em revistas de denúncia no Maranhão.
De acordo com o Dicionário de Mulheres do Brasil: de 1500 Até a Atualidade (Ed. Zahar), ela criou, aos 55 anos de idade, uma escola gratuita e mista para crianças pobres, na qual lecionava. Maria Firmina morreu aos 92 anos, na casa de uma amiga que havia sido escrava.