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quarta-feira, 16 de agosto de 2017

EXISTEM MINORIAS ONDE HÁ SEMPRE MAIORIAS? (capturas do Facebook)



Olá, sempre é bom flagrar bons escritores que tem algo a dizer de atual e que atendem aos desejos do social, Prof. Dr. Florisvaldo Mattos-  UFBA, isto no seu facebook...   https://www.facebook.com/florisvaldo.mattos
Paulo Vasconcelos
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Recebo por e-mail (como talvez dezenas de outros destinatários) este alentado texto do austríaco-baiano Reinhard Lackinger, que, desafiando êxtases sensoriais, aufere o prazer de degustar todas as tardes um chope gelado numa luminosa calçada, mirando o pôr-do-sol do Porto da Barra, que é só um espetáculo de luz e cores, no qual põe em discussão o significado e a veracidade do termo "minorias", talvez a palavra mais presente em debates socioculturais da atualidade brasileira, depois de corrupção, ao que deduzo, divisando nisso uma contradição, desde que o que em geral se chama de "minorias" são na verdade e na essência maiorias. Por exemplo (quase transcrevo o que ele diz): como aceitar que 80% da população de Salvador, composta de negros e afrodescendentes, possa ser classificada como "minoria"? Dá realmente para pensar.

Sem se alçar patrono de um debate, creio que a instigação de Lackinger merece, além de leitura, detida e serena, apreciação e reflexão e, por isso, resolvi reproduzi-la abaixo, em compartilhamento. Portanto, enrosquem-se nela e se manifestem.

Quando as Minorias tendem a ser Maioria
Reinhard Lackinger
Confesso ter dificuldades quando o assunto é "minorias"! Principalmente em se tratando de indígenas e negros deste nosso Brasil!
Pindorama estava cheio de indígenas de tudo que era tribo. Por essa razão podemos falar em minorias dos erroneamente chamados índios, só depois de boa parte da chacina, do genocídio ter sido consumado!

Por que será que mesmo com toda essa matança sobraram mais indivíduos nativos no Brasil do que na América do Norte? 
Terá sido por causa do clima inóspito nas florestas amazônicas, os pantanais cheios de répteis, piranhas, jacarés, onças e insetos transmissores de malária?

Será que foi porque nossa gente desde sempre preferiu deitar-se com as índias em vez de matar aborígenes? É pelo menos essa a ideia que Pero Vaz de Caminha nos passou!
Minhas dúvidas acerca desse tema não param por aí. 

Quantas vezes já não vimos reportagens de TV mostrando disputas por de terras indígenas, tendo o fazendeiro invasor quase branco mais cara de índio do que os supostos nativos?

Quantos rostos com traços indígenas costumamos encontrar diariamente nas ruas, nos shoppings, nos escritórios e no congresso? Há minorias e mais minorias ao nosso redor do que imaginamos.

Se os EUA têm gente famosa oriunda de povos nativos, nós também os temos!
Na música por exemplo, que me ocorre neste momento. Lá eles tem os saudosos trombonistas do jazz Kid Ory e Jack Teagarden. Nós temos o nosso Rei Roberto Carlos. O rosto e os cabelos de nosso pop star de Cachoeiro de Itapemirim não me deixa mentir. Repare se as feiões dele não se parecem com as de um cacique, de um pajé ... ou melhor, com as de uma "squaw"!

O finado cacique do povo xavante e deputado federal Mário Juruna tem sido minoria absoluta no congresso nacional. 
O talvez primeiro cidadão e político brasileiro a denunciar as maracutaias e ladroagens de congressistas. Ele quase perdeu o mandato por ter tido essa coragem!
Não deve ser nada cômodo e fácil pertencer à minoria indígena do Brasil.
Marcos Terena, aviador, líder indígena e escritor, quando ainda estudava, chegou a declarar-se descendente de japonês, segundo ele próprio confessou diante de câmeras de televisão.

Enquanto um número cada vez mas reduzido e menor pode justificar o uso da expressão "indígena", o que dizer dos negros brasileiros?
Como uns 80% dos habitantes da Roma Negra, de Salvador podem ser considerados "minoria"?
Ouso arriscar um palpite e sugerir que 99% desses 80% permanecem invisíveis aos olhos dos que se julgam brancos. Sobra assim apenas uma minoria de negros com os quais nós nos relacionamos diariamente e em nosso círculo mais íntimo. Com a crescente falta de serviçais e empregados domésticos, essa "minoria" tende a ficar ainda mais reduzida. 
Outro detalhe importante! Nem todos os negros pertencem à mesma minoria!
Uns vivem cercados por todo tipo de cuidados, outros convivem com urbanização, ordem pública e situação familiar precárias. 

Deve ser por isso que o sistema de cotas para negro e índio ter acesso à universidade não contempla quem tenha feito o primeiro e segundo graus em escolas particulares.

Considero cotas para acesso a instituições de ensino e o serviço público coisa séria, embora saiba que qualquer sistema, por mais bem elaborado que seja, é injusto! Mais injusto porém seria manter o ônus das desigualdades sociais apenas nas costas dos negros e mestíços!
Ações afirmativas devem importar mais para quem pertence a alguma minoria. 
Assunto cheio de opiniões conflitantes. Direitos iguais para mulheres, transgêneros e todos que se assumem como "minoria". Inclusive algum imigrante acidental vindo dos Alpes austríacos, residindo no Brasil há quase 50 anos.

E por falar em cotas ... Na época de Hitler e do nazismo e desde 1933 havia o tal "passaporte genealógico", o "Ahnenpaß". Quem conseguisse comprovar a "limpeza étnica", ou seja, de não ter nenhum judeu, cigano ou outro parente de origem "suspeita" na árvore genealógica até o ano 1800 conseguia obter esse documento tão desejado por uns. Ele permitia por exemplo que os filhos da família com "Ahnenpaß" estudassem em instituições de ensino especial que visavam formar oficiais para o Terceiro Reich que haveria que durar 1.000 anos. Os arianos eram para ser maioria, imagino! Não sei dizer se os tais arianos e alemães com "Ahnenpaß" chegaram realmente a ser maioria no povo alemão e austríaco. Duvido muito! Só sei que esse nefasto desvario durou apenas pouco mais de uma década.
O encontro de minorias costuma promover tensões, mas também alta cultura. Sem choques de costumes diferentes não há alta cultura! Percebemos isso em cidade que em dado momento tiveram um forte afluxo de imigrantes. Foi assim com a capital do Império Austro-Húngaro, Viena, com Nova Iorque e também com São Paulo.
Há minorias nas respectivas colônias no cone sul do Brasil que num primeiro momento visavam apenas a sobrevivência. 
Quando a fome deixa de ser o inimigo comum, as aspirações dessas minorias podem sofrer uma curiosa metamorfose, podendo desencadear até o desejo de separar-se do país que os acolheu. Foi mais ou menos assim com os diversos "países coroa", as tais "Kronländer" que haviam constituído a Monarquia do Danúbio, com a antiga Iugoslávia e com a União Soviética. Por enquanto, o sucesso e o destino da União Europeia está incerto.

Penso que o desejo das minorias - visíveis ou não - é a perpetuação de seu idioma, de sua cultura! Da mesma forma que as monoculturas rurais e urbanas são danosas a um país, passar o trator por cima de diversidades humanas fatalmente termina em tragédias e no crescente fascismo que assistimos hoje de camarote.
Quanto mais miscigenação, mais cultura, menor chance do indivíduo sentir-se superior ao próximo e menor possibilidade da volta do "nazifascismo"!
Salvador, 16 de agosto de 2017

Ilustração: "Retratos da Bahia", de Carybé.

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