Paulo Vasconcelos
São Salvador-Ba tem estereótipos que não combinam; sim, ela
tem cheiro de dendê, igrejas velhas, Farol da barra, baianas, fitas do Bomfim. Mas
tem mais que isso: tem suor de trabalhador, com ou sem terno, no avionado das
ruas. Faz-se festas, e também os congressos internacionais, encontros de
managements do mundo, o turismo pesado e o capital se alvoroça nas ruas com a petroquímica
agribusiness, produção de serviços e tecnologia. A
Coca-Cola invade para se misturar com o abará e o beiju.
O Carnaval do turismo ajudou esse estereótipo, em conluio
com a mídia televisiva e a cinematográfica. O Carnaval se dá em poucos bairros,
o litoral urbano, e o olho bêbado não espia tudo. Pior: criou-se uma Indústria
do Carnaval com o aval de artistas, indústrias, governo e mídia. Não há mais
carnaval popular da Saborosa, de Dodô & Osmar, mortalha, hoje ele é
uma réplica midiática modificada da festa carioca brodiuniana.
A Arquitetura Nova não conhecida (vide Caramelo, Isaias
Neto) é estrelada pelas avenidas: A Antônio Carlos, claro, Paralela, T. Neves,
edifícios imensos, comerciais e da burguesia, mais a classe média, varanda gourmet, um quarto; e espia-se por trás
os bate laje, com favelas e favelas de vasta população, hoje, quarta maior
cidade do Brasil. As esculturas ainda, mas há algo de Botero, será? Grandes
CEOS vão às mães de Santos nos terreiros e são recebidos com cerimonial afro.
Os Magalhães, mais que Tomé de Souza, Garcia Dávila,Casa da Torre, insistem,
mas parte do povo - a esquerda atenta. As universidades públicas têm
excelência, as multinacionais engolem o aluno mais pobre que mistura-se aos
ricos que não entraram nas públicas, mas estuda-se. O teatro, o cinema e a música
esbanjam diferenças das caduquices do sudeste brasileiro, e tem público para muitas
conchas acústicas. O axé canta coro com a mpb, com o rock, o blues, o jazz, o pop
e as músicas dos terreiros.
Há um Lá ele, bacana!
Ascende a Cosmópolis-mor do Brasil, com trânsito caótico, carros, roupas de
cores, tecnologia de ponta, “Shopinguins” enormes, outros mini, e persistem a
feira de São Joaquim, o Mercado Público do Rio Vermelho que não faz inveja ao
sudeste.
O sal, as variedades brasílis,
o ar marinho, cores naturais e espelhadas dos pórticos dos prédios performanceiam
a megalópole, insiste a flor da noite-pipoca, as frutas e verduras em bancas,
espalhadas pela cidade, bicicletas; os vendedores gritam antigos refrãos, do
cuscuz; o wi-fi que se cruza pelos bares;
o bom dia, boa tarde e noite são passaporte; e escuta-se Maria Bethânia, Caetano,
Ivete, Mariene de Castro, Gil, Alexandre Leão, Ilê Ayê, Moreno, Brown, Saulo, C.
Cunha, Jammil, Chiclete, Asa de Águia, Flavia Wenceslau, Silvano, La Fúria e
vai e vai e desce o sal pelas Avenida
Sete , Chile, o bairro de Águas Claras, Cajazeiras,
Fazenda Grande 1 e 2. Imensa cidade, uma barra litorânea imensa, um metrô pequeno,
um futebol de torcidas, carnaval como uma indústria e uma grande balança
comercial. Grandiosa.
Bata tudo em ponto de Brasil e depare-se com um verde vasto,
restaurantes das redes globais com drinques de aperol, rum, whisky, vinhos,
cachaça, cerveja, chope. Mastiga-se carne de fumeiro, com farofa de banana da
terra, caranguejo, afora churrasco, fatada, ufa! e os saguins, corujas,
morcegos e outras faunas observam Tonha da cocada, os sorvetes de Gela goela e
Gela bico. Na mesma batida, há os bairros: Brotas, Graça, Liberdade, Nazaré,
Pelourinho, Cais dourado, São Joaquim, Campo Grande, Itaigara (com odor de
classe média paulistana e de festas de cachorros na praça Ana Maria Magalhães,
com bolo, balões e ossos para os cachorros da molesta imitando os americans paulistas).
A língua soteropolitana, aliás, acho estranho esta
denominação, prefiro baianosá, tem
imensas cores, e um toucinho peculiar com renda, gripi, vai do meu rei ao
patrão, doutor, lá ele, apoi, meu, isso mesmo, meu e o tal do tomei, no lugar
de levei (um susto, um gol), apaulistando-se.
O baianosá tem um campo lexical que o diversifica no
nordeste, pela incorporação do falar dos estados vizinhos: mineirice e criolice
dos hábitos de cariocas e paulistas, assim é uma gordura de qualidade
linguística diferenciando-a. Apesar da força das midiotices, o povo come e
arrota em suas peculiaridades, fazendo menos chué – a fala citadina em seu discurso.
Gregório, Castro Alves, Amado, Adonias, Ubaldo, Sosígenes
seguem firmes, mas há novos e muitos que lambuzam com boa saliva a língua, e
produzem uma literatura de fôlego que é a cara do Brasil, não é Lívia, Ari
Sacramento, Flávio V. M. Costa? E ainda o Espinheira, Miriam Fraga (saudosa),
Antonio Torres, Pereyr, Risério, Moniz Bandeira e haja! Que bom Baianosás!
AH! E baiano não engole ovo só, atira em fascistas!!!!!!!!
AH! E baiano não engole ovo só, atira em fascistas!!!!!!!!
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