Livro revela detalhes de época de tolerância sexual na China
EFE | 19/04/2011 09:07A+A-
As memórias de Sir Edmund Trelawny Backhouse, que viveu quase 50 anos na China do início do século 20, estão sendo lançadas com a promessa de revelar que a famosa Imperatriz Cixi foi assassinada e outros detalhes de uma época que o autor apresenta como de grande tolerância sexual. Backhouse, que residiu no país de 1898 até sua morte, em 1944, foi um peculiar personagem com um perfeito conhecimento da língua chinesa e seus excepcionais contatos com a corte manchú.
O livro, intitulado "Decadence Mandchoue: The China Memoirs of Sir Edmund Trelawny Backhouse" ("Decadência Manchu: As Memósrias Chinesas de Sir Edmund Trelawny Backhouse", em tradução livre) é, segundo seu editor, Derek Sandhaus, "uma fantástica fábula escrita por um encantador autor com um endiabrado senso de humor". É também um desafio aos livros de história, ao assegurar que, diferentemente da crença habitual de que morreu de causas naturais, a imperatriz Cixi teria sido assassinada, da mesma forma que o imperador Guangxu, que morreu um dia depois dela.
Uma característica importante de Backhouse é sua homossexualidade, o que ia contra o puritanismo da época (ele saiu da Inglaterra quando Oscar Wilde, a quem deu publicamente seu apoio, foi processado por sodomia), e que em suas memórias se reflete em relatos sobre seus escarcéus sexuais. "A China tinha, pelo menos para os homens, uma cultura muito mais liberada sexualmente há cem anos que o Ocidente naqueles tempos", explica Sandhaus à Agência Efe.
Intelectuais chineses e integrantes da corte manchú mantinham relações homossexuais abertamente e grande parte da vida social desses círculos girava ao redor da Ópera de Pequim, que era inseparável da prostituição masculina, acrescenta o editor-chefe da Earnshaw Books, primeira editora a publicar estas memórias.
O alto conteúdo sexual dificultou a publicação do livro na China, muito mais puritana do que há um século. Segundo Sandhaus, a edição inglesa estará disponível em livrarias do país, enquanto a chinesa por enquanto só será vendida em Hong Kong, como costuma ocorrer com livros barrados pela censura comunista.
Outra questão em torno ao livro são as dúvidas sobre sua veracidade: Backhouse era conhecido por sua imaginação e as memórias foram relatadas a um médico quando ele já estava idoso e doente. Alguns historiadores duvidam da exatidão deste relato, o que fez com que passasse quase 60 anos sem ser publicado. O jornal de Hong Kong "South China Morning Post" especifica que um dos grandes críticos destas memórias, o professor da Universidade de Oxford Hugh Trevor-Roper, confiou nos supostos diários de Adolf Hitler que finalmente provaram ser falsos.
"Backhouse é uma figura contraditória, porque aparentemente tinha uma imaginação fértil, mas não devemos repeli-lo por isso", ressaltou Sandhaus. "Viveu em Pequim durante o período que descreve, falava chinês e manchú e tinha um conhecimento da política e da cultura chinesa que supera em muito outros escritos daquele tempo", acrescentou. "Inclusive se o que conta são fofocas, são fofocas de fonte bem informada, e na capital chinesa as intrigas costumam estar mais próximas da informação real do que os relatórios oficiais", afirmou.
Backhouse, que era poliglota - falava também francês, russo, latim, grego, japonês, entre outros - trabalhou como intérprete para os diplomatas britânicos e evitava o contato com outros estrangeiros, provavelmente pelo fato de ser homossexual.
Os jornalistas ingleses da cidade de Pequim da época diziam que ninguém falava chinês como ele, mas que não era fácil encontrá-lo: quando passava perto de outros estrangeiros escondia seu rosto e pedia a seus empregados que lhe avisassem da proximidade de estrangeiros para evitá-los ao sair de casa.
Testemunha de uma tumultuosa época, Backhouse morreu em um hospital de Pequim e está enterrado em um cemitério católico da capital chinesa.
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