Documentário apresenta debate polifônico entre 100 realizadores da cultura brasileira
05/10/2010
Cristiano Navarro
da Redação
Na maioria das vezes, quem lê, ouve ou assiste não sabe o que está por trás de um produto cultural. Furando o pano dos cenários das artes, o documentário multimídia “Produção Cultural no Brasil” traz por meio de 100 entrevistas o pensamento e as ações de gestores, produtores, diretores, trabalhadores de bastidor e ativistas.
Os depoimentos sobre a cultura brasileira contemporânea têm seis minutos cada e estão sendo colocados em uma plataforma livre na internet:http://www.producaocultural.org.br.
Inezita Barroso from FLi Multimídia on Vimeo.
Publicado a partir de setembro, é possível interagir com o projeto em redes sociais – como Twitter, Orkut e Facebook –, dialogando com seus realizadores. O internauta pode ainda baixar as transcrições, fotos, vídeos e áudios das entrevistas para utilizar como desejar.
Em novembro, quando todos os 100 personagens estiverem incluídos na página, cinco livros serão editados e lançados com os 600 minutos de depoimentos completos. Os exemplares serão distribuídos para as bibliotecas nacionais e universitárias e, ao mesmo tempo, ficará integralmente disponível para download gratuito.
O projeto é realizado pela Casa da Cultura Digital, a Cinemateca Brasileira, a Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC) e o Ministério da Cultura. Segundo Rodrigo Savazoni, da Casa de Cultura Digital, a idéia do “Produção Cultural” é ser um guia básico para todos que queiram trabalhar com cultura no Brasil, nas diferentes funções que o setor mobiliza.
Savazoni explica que, na escolha dos participantes, alguns critérios, sem muita rigidez, foram respeitados. “Os aspectos regionais, de ter gente de todos os cantos do país, foi algo que se buscou. Também questões étnico-raciais e de gênero foram respeitadas. Também procuramos trabalhar nomes de diferentes gerações, para produzir um mínimo de contraditório. O projeto é ecumênico. Tem gente que sente falta de um determinado tipo de representação, um ou outro nome importante não topou participar”.
Compondo um panorama diverso, o projeto envolveu figuras independentes, populares e de mercado, que vão de algumas mais conhecidas como o diretor do Teatro Oficina, José Celso Martinez, e o produtor musical, Nelson Motta, até o poeta fundador da Cooperifa, Sérgio Vaz, e o percussionista e dirigente do Maracatu Paiba de Ouro, Manoel Salustiano Filho.
No documentário, os pontos de vista são apresentados de lugares sociais distintos e apontam caminhos diferentes que, inclusive, se chocam. A polifonia e o formato não linear de leitura constroem um mosaico de opiniões sobre o papel do Estado junto à cultura, propriedade intelectual, formas de produção, entre outros temas. “Não existe democracia sem conflito, um aspecto fundamental para o avanço da sociedade. Mas a minha sensação é que estamos vivendo em um país que está aprendendo a conviver com a diversidade de opiniões, que quer dialogar, que quer encontrar soluções para seus desafios, sem reduzir toda e qualquer questão a uma visão maniqueísta”, comenta Savazoni.
Para além do que vai ao ar até novembro, a plataforma multimídia “Produção Cultural Brasileira” é um catálogo de consulta aberto que, por meio da participação do público, pode ser permanentemente construído com novas entrevistas. Ou, como destaca Savazoni, “a principal riqueza desse trabalho é o de apresentar as múltiplas vozes num plano comum, onde todos de alguma maneira nos encontramos”.
A seguir, alguns trechos extraídos dos depoimentos:
André Midani, executivo da indústria fonográfica
“Olha, eu vou te dizer, é muito difícil para falar de política cultural num país como o Brasil. Muitas vezes, eu acho que esse 'debate de política cultural' é uma grande injustiça com as classes menos favorecidas que não precisam de cultura, elas precisam de educação, elas precisam de hospital, elas precisam de coisas que posteriormente permitirão a eles o acesso a cultura.”
José Celso Martinez Corrêa, Diretor do Teatro Oficina
“A gente descobriu a geração de 68, que me fez a cabeça e o corpo – fez tudo, entendeu –, praticamente esta geração de 68, eu acho que foi muito sacrificada. Eu tinha 30 anos, os jovens tinham 20: eles foram massacrados porque eles não podiam mais fazer aquilo que eles tinham todo o talento para fazer.”
Sérgio Vaz, Poeta e fundador da Cooperifa
“Meu, a Cooperifa é um movimento cultural, não é um lugar, é um sentimento, é um lugar em que a gente construiu uma nova auto-estima para o bairro, para a gente. [...] Para nós, a Cooperifa é a nossa Primavera de Praga, é a nossa bossa nova, é a nossa tropicália, é uma coisa que está acontecendo em nossas vidas e é a primeira vez – e todo mundo que faz a coisa pela primeira vez é muito mais intenso.”
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